Após quatro anos seguidos com taxas superiores a 10 mil km2, o desmatamento da Amazônia Legal caiu e voltou a ficar abaixo disso. Entre agosto do ano passado e julho deste ano, a perda de vegetação na floresta foi de 9.001 km2, queda de 22,3% em relação aos 12 meses anteriores. É a menor taxa desde 2018.
Os dados preliminares do sistema Prodes, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que fornece a taxa oficial de desmatamento da Amazônia, foram divulgados na tarde desta quinta-feira (9) pela ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, em um evento no Palácio do Planalto.
Ela estava acompanhada dos ministros Luciana Santos (Ciência, Tecnologia e Inovação), Sonia Guajajara (Povos Indígenas), Paulo Teixeira (Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar) e Carlos Fávaro (Agricultura), além de Miriam Belchior, secretária-executiva da Casa Civil, e Maria Laura da Rocha, secretária-geral do Ministério das Relações Exteriores.
Apesar da redução, o desafio ainda é grande para zerar o desmatamento até 2030 – compromisso assumido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) assim que assumiu o governo.
Antes disso, já em 2025, o Brasil precisa conseguir reduzir as emissões de gases de efeito estufa a 1,3 gigatoneladas de CO2-equivalente, conforme prometido na meta brasileira junto ao Acordo de Paris. Como o desmatamento da Amazônia é nossa maior fonte desses gases, calcula-se que para atingir o objetivo, a perda da floresta tem de chegar a algo em torno de 6 mil km2 daqui a dois anos, segundo cálculos do Sistema de Emissões de Gases de Efeito Estufa (Seeg) do Observatório do Clima.
É praticamente metade do que foi medido no último ano de Bolsonaro (11.594 km2). Ou 33% a menos que a taxa de 2023.
Não é uma tarefa trivial, apesar de já ter sido desempenhada no passado. Entre 2004, quando a taxa atingiu o seu segundo maior valor (27.772 km2), e 2012, quando foi registrado o menor desmatamento da série histórica (4.571 km2), a queda foi de 83%.
Mas o sucesso deste primeiro ano de governo pode não se repetir nos próximos, diante das pressões que vêm do Congresso. E o índice deste ano ainda está acima do que foi registrado nos anos anteriores aos do governo de Jair Bolsonaro (PL).
A média anual do desmatamento na gestão de Michel Temer foi de 7.241 km2. No segundo governo de Dilma Rousseff (2015 e 2016), a média foi de 7.050 km2. Já no seu primeiro mandato, foi de 5.473 km2 – a menor desde o início do monitoramento do Prodes, em 1988. Nos anos Bolsonaro, a média foi de 11.396 km2.
A redução é reflexo direto da retomada das atividades de fiscalização do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e de um plano de combate ao desmatamento que ocorreu logo no início do governo Lula. Como a taxa Prodes é contabilizada sempre de agosto de um ano a julho do ano seguinte, a de 2023 ainda foi influenciada pelo que ocorreu no fim do ano passado.
Nos cinco últimos meses de 2022, no final do governo Bolsonaro, os alertas de desmatamento feitos por outro sistema do Inpe, o Deter, indicavam uma aceleração do desmatamento. De agosto a dezembro, mesmo com o início da temporada de chuva no fim do ano, que torna a atividade de corte florestal muito mais difícil, os alertas foram 54% mais altos que os do mesmo período de 2021. O avanço se deu diante da expectativa de mudança de governo e justamente de retomada do controle, praticamente abandonado nos anos Bolsonaro.
Entre janeiro e julho deste ano, tão logo a política para a Amazônia mudou, com mensagens clara de que o crime ambiental não seria mais tolerado, a curva se inverteu e houve uma redução de 42% nos alertas do Deter. Foi essa redução nos sete primeiros meses que acabou interferindo no cômputo geral do Prodes. Apesar de serem sistemas de monitoramento com metodologias distintas, o Deter acaba servindo como uma boa estimativa do que o Prodes vai mostrar depois.
Com a redução apresentada nesta quinta, Lula chegará à 28ª Conferência do Clima da ONU, a COP28, que acontece em Dubai em dezembro, em condições de mostrar que seu governo recolocou o país na trilha do cumprimento de seus compromissos sob o Acordo de Paris.
De acordo com os cálculos do MMA, a queda do desmatamento na Amazônia Legal evitou a emissão de 133 milhões de toneladas de CO2-equivalente no período, na comparação com os dados de 2021/22. O valor representa 7,5% das emissões nacionais em 2020.
“Assumimos com um passivo de 6 mil km2 [do governo Bolsonaro] que foram computados ao desmatamento de 2023. Mas como conseguimos uma redução de 42% graças às ações emergenciais e medidas mais estruturantes, isso incidiu sobre a taxa global de desmatamento”, declarou Marina.
“Por trás disso tem as decisões políticas do presidente Lula de desmatamento zero, de que o plano é a política transversal, e uma ação integrada do governo para alcançar esse resultado em cima de eixos não apenas de comando e controle, mas de desenvolvimento sustentável, instrumentos econômicos, ordenamento territorial e regularização fundiária”, complementou.
O contraste com o governo Bolsonaro não é só nos números. A relação do governo federal entre 2019 e 2022 com os dados que revelavam o processo de destruição que estava em curso na Amazônia foi o tempo todo marcada por conflitos. Foi da negação dos números a uma tentativa de ocultar as informações.
Já no primeiro ano, quando os alertas do Deter começavam a mostrar que a motosserra estava acelerada, o presidente Jair Bolsonaro inicialmente questionou os números, acusou o então diretor do Inpe, Ricardo Galvão, de estar “a serviço de alguma ONG” e acabou o demitindo.
Quando os dados do Prodes foram divulgados, no fim daquele ano, confirmando a alta no desmatamento, o então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, chegou a ir à sede do Inpe, em São José dos Campos, para anunciar os dados, mas minimizou o papel do seu governo na alta, justificando que as taxas já estavam crescendo nos anos anteriores. Já em 2020, quando ocorreu um novo aumento, ele nem apareceu na coletiva.
Depois, tanto em 2021 quanto em 2022, mesmo com os dados do Prodes já fechados, sua divulgação foi adiada para não coincidir, por exemplo, com a realização da Conferência do Clima da ONU.
Neste ano, a postura mudou. Não só o governo retomou o Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm), em anúncio feito pelo próprio Lula, houve total transparência na divulgação das informações.
Todos os dados do Deter deste ano foram anunciados publicamente pelos ministérios do Meio Ambiente e da Ciência e Tecnologia. E o Prodes teve o status de ser comunicado em coletiva à imprensa no próprio Palácio do Planalto, após uma reunião da Comissão Interministerial Permanente de Prevenção e Controle do Desmatamento.