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Reportagem

De cada lado do balcão, um Castor de Mattos

Citado por Gilmar Mendes, procurador da Lava Jato Diogo Castor de Mattos e seu irmão advogado, Rodrigo, aparecem atuando juntos em pelo menos cinco procedimentos judiciais da 13a Vara Federal de Curitiba

Reportagem
9 de maio de 2018
12:56
Este artigo tem mais de 6 ano

Em conversas reservadas, pessoas ligadas à operação Lava Jato costumam chamar o advogado curitibano Rodrigo Castor de Mattos como “o irmão do procuradorzinho”. Se referem ao procurador Diogo Castor de Mattos, 30, integrante mais jovem da força-tarefa da operação.

Rodrigo é advogado criminal em Curitiba desde 2004, com ênfase em crimes contra a administração pública, o sistema financeiro nacional, a ordem tributária e lavagem de dinheiro, como detalha na página de seu escritório, Delívar de Mattos & Castor.

Os nomes dos irmãos são listados juntos em pelo menos cinco procedimentos judiciais que tramitam na 13ª Vara Federal de Curitiba, comandada pelo juiz Sérgio Moro. De lados opostos: o primeiro como advogado de defesa e o segundo como membro do Ministério Público.

A atuação de Rodrigo na Vara de Moro, onde tramitam todos os casos da Lava Jato, é bem maior que em todas as demais da Justiça Federal do Paraná. São 16. Na 14ª Vara, são sete. Nas demais, números inferiores.

Diogo Castor de Mattos é o integrante mais jovem da força-tarefa da operação

Destas 16 ações, a grande maioria (13) é de depois de 2014, ano em que Diogo entrou na força-tarefa da Lava Jato. Ele ingressou na carreira de procurador federal em 2013.

A atuação de familiares no mesmo processo é vedada pelo artigo 258 do Código de Processo Penal. Diz o texto: “Os órgãos do Ministério Público não funcionarão nos processos em que o juiz ou qualquer das partes for seu cônjuge, ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive, e a eles se estendem, no que lhes for aplicável, as prescrições relativas à suspeição e aos impedimentos dos juízes”.

A força-tarefa do Ministério Público Federal (MPF) afirma que Diogo não atua nos mesmos casos que o irmão, embora ambos apareçam no rol das partes nos processos mencionados. Segundo o MPF, todos os integrantes da força-tarefa são relacionados nos processos, mas nem todos atuam em todos os casos.

Uma das ações em que os irmãos aparecem juntos é a que condenou o ex-ministro José Dirceu (PT) a 11 anos e três meses de prisão pelo recebimento de propina ligada à diretoria de Serviços da Petrobras. O ex-diretor da pasta Renato Duque e Luiz Eduardo de Oliveira e Silva, irmão de Dirceu, também foram condenados.

Nesse caso, Rodrigo é defensor de Eduardo de Meira, então dono da empresa Credencial, que teria sido usado para intermediar subornos ao ex-ministro. Ele foi preso na deflagração da 30ª fase da Lava Jato (“Vício”), em maio de 2016, e só foi solto da prisão preventiva em outubro do ano passado, após ter recorrido ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Uma das ações em que os irmãos aparecem juntos é a que condenou o ex-ministro José Dirceu (PT)

Outro caso é a delação premiada do marqueteiro de governos do PT João Santana e sua mulher, Monica Moura, presos na fase “Acarajé” da operação. Foi esse processo que chamou atenção do ministro Gilmar Mendes, do STF, e o levou a publicamente pedir que a Procuradoria-Geral da República (PGR) investigue a relação entre os irmãos.

Na sessão de 11 de abril deste ano, o ministro aproveitou o julgamento de um habeas corpus do ex-ministro Antonio Palocci para falar sobre o assunto. Ele interrompeu o voto do colega Ricardo Lewandowski para afirmar que “a corrupção já entrou na Lava Jato, na Procuradoria”.

Primeiro, o ministro citou que o advogado Roberto Batochio o procurou para informar que estava deixando a defesa de Palocci por uma exigência da força-tarefa de Curitiba para as negociações da colaboração premiada do ex-ministro.

Gilmar Mendes pediu que a Procuradoria-Geral da República (PGR) investigue a relação entre os irmãos

Mendes, então, citou Rodrigo Castor de Mattos. Segundo ele, haveria a exigência de que vários processos passassem pelo escritório do advogado. Depois que o caso se tornou público, a atuação teria passado a ser clandestina.

Rodrigo entrou como advogado de João Santana em abril de 2017. A delação premiada do publicitário, firmada em 8 de março do mesmo ano, foi negociada por um escritório parceiro, também de Curitiba, que pertence aos advogados Alessi Brandão, Beno Brandão e Juliano Campelo.

Na mesma sessão, o ministro cobrou explicações da Procuradoria sobre a atuação do ex-procurador Marcelo Miller, ex-braço-direito de Rodrigo Janot contratado pelo escritório que fechou o acordo de leniência com a JBS três meses depois de ter deixado o Ministério Público. “Não queria falar sobre isso mais uma vez, doutora Raquel, mas a corrupção já entrou na Lava Jato, na Procuradoria. Ou alguém tem dúvida do episódio, que hoje está nos jornais, da atuação de Fernanda Tórtima e Marcelo Miller? Um caso de corrupção. Isso tem que ser investigado, tem que ser dito”, disse Mendes. Miller nega irregularidades.

Na última sexta-feira (4), a assessoria de imprensa da PGR informou que não havia notícias sobre a abertura de um procedimento baseado nas alegações de Mendes. Segundo a instituição, deve haver uma formalização do pedido para que isso ocorra, o que não foi feito até então.

No dia seguinte às declarações do ministro, a força-tarefa do MPF divulgou uma nota em que rechaçou as acusações, chamadas de “notícias antigas e falsas”.

“A fala do ministro Gilmar Mendes desbordou o equilíbrio e responsabilidade exigidos pelo seu cargo, fazendo não só acusações genéricas e sem provas contra a atuação do Ministério Público Federal, mas especialmente imputações falsas contra o procurador da República Diogo Castor de Mattos com base em notícias antigas e em suposto ‘ouvir dizer’ de desconhecidos advogados”, diz trecho do texto.

Rodrigo Castor de Mattos é advogado criminal em Curitiba desde 2004

A força-tarefa afirma ainda que Diogo não atua em nenhum dos casos envolvendo João Santana. E dá uma alfinetada em Mendes: “O procurador da República Diogo Castor de Mattos na força-tarefa da Lava Jato não atuou na investigação de João Santana por decisão própria […], comportamento esse que o próprio ministro Gilmar Mendes não observou quanto ao seu impedimento em medidas judiciais relativas ao investigado Jacob Barata Filho”. O ministro – que é padrinho de casamento da filha dele – concedeu três habeas corpus ao empresário carioca.

Outra irmã trabalha no escritório de Rodrigo como sócia-fundadora (mesmo cargo dele). É Analice Castor de Mattos, especializada nas áreas de direito empresarial e aduaneiro.

Analice, Rodrigo e Diogo são filhos do falecido procurador de justiça Delívar Tadeu de Mattos e de Maria Cristina Jobim Castor de Mattos, que, por sua vez, é irmã de Belmiro Jobim Castor, ex-diretor do Bamerindus, ex-secretário do Paraná por diversas vezes entre os anos 1970 e 1980 e integrante do Conselho Superior da Associação Comercial do Paraná.

A genealogia foi compilada pelo cientista político da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Ricardo Costa de Oliveira. Ele fez o mesmo com os demais integrantes da força-tarefa, magistrados e advogados ligados à operação.

O resultado, segundo o pesquisador, é que todos descendem de nomes importantes do cenário político e judiciário regional, evidenciando parentescos e proximidades entre eles. O trabalho será apresentado na segunda quinzena deste mês.

A reportagem da Pública procurou Rodrigo e Diogo Castor de Mattos. O primeiro disse que não tinha interesse em falar sobre o assunto. O segundo chegou a marcar uma entrevista para falar, mas desmarcou uma hora antes. As perguntas foram enviadas por e-mail no mesmo dia, mas, até o momento, não foram respondidas.

Alteração em 10 de maio de 2018 às 15h40: Retificamos a informação de que Diogo e Rodrigo Castor de Mattos aparecem atuando juntos em cinco processos. Na verdade, foram cinco procedimentos judiciais localizados pela reportagem. Portanto, no resumo e no texto da matéria o termo cinco processos foi substituído por cinco procedimentos judiciais. No mesmo texto substituímos força-tarefa da PGR, termo equivocado, por força-tarefa do MPF.

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