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Checagem

Flávio Rocha cita dados falsos sobre segurança pública

Pré-candidato à Presidência exagerou número de evangélicos e acertou beneficiados do Bolsa Família em Pernambuco

Checagem
15 de maio de 2018
12:05
Este artigo tem mais de 6 ano
O empresário Flávio Rocha (PRB), que já foi deputado, voltou à política para disputar a Presidência
O empresário Flávio Rocha (PRB), que já foi deputado, voltou à política para disputar a Presidência

O empresário Flávio Rocha, dono da rede de lojas de varejo Riachuelo, não é uma figura nova na política. Ele cumpriu dois mandatos como deputado federal pelo Rio Grande do Norte entre 1987 a 1991. Nesse período, foi filiado ao Partido da Frente Liberal (PFL, atual DEM), migrou para o Partido Liberal (PL, que virou PR depois de se fundir com o PRONA) e ao Partido da Reconstrução Nacional (PRN, atual PTC), que elegeu Fernando Collor de Mello como presidente da República. No dia 27 de março, Rocha voltou à cena com o lançamento da sua pré-candidatura à Presidência pelo Partido Republicano Brasileiro (PRB), controlado por grupos evangélicos.

Defensor de uma agenda econômica liberal para o país, o empresário lançou o manifesto do movimento Brasil 200 em janeiro. Nele, defende a menor participação do Estado na economia, menos impostos e o projeto Escola Sem Partido, entre outros princípios. Em artigo para a Folha de S.Paulo em 18 de março, o coordenador do Movimento Brasil Livre (MBL) Kim Kataguiri anunciou que o presidenciável é o candidato do MBL.

O Truco – projeto de fact-checking da Agência Pública – tem analisado o discurso de todos os presidenciáveis. Foram selecionadas quatro frases da entrevista de Rocha à TV Folha, em 10 de abril, para verificar. A assessoria de imprensa do pré-candidato enviou as fontes das afirmações ao ser solicitada, mas não contestou os resultados no prazo estabelecido.

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“98% de assaltos a mão armada ficam na completa impunidade e 92% dos homicídios.”

Falso

Não existe uma taxa de elucidação de homicídios em âmbito nacional. O dado já foi tema de outras quatro checagens do Truco com base em frases de Wilder Morais, Gilmar Mendes, Ciro Gomes e João Amoêdo – todas elas foram classificadas como falsas. Também não existe estudo que traga uma taxa nacional de solução ou elucidação de assaltos a mão armada. Rocha usou dois dados falsos em sua fala.

Procurada pelo Truco, a assessoria de imprensa do presidenciável citou como fontes para o dado sobre homicídios uma estimativa de Julio Jacobo Waiselfisz, coordenador da pesquisa Mapa da Violência 2011, e um estudo do Ministério da Justiça que utilizaria dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). “Segundo estimativa de Waiselfisz, de cada 100 homicídios no Brasil, apenas 8 são apurados, e nem todos os crimes apurados resultam em condenação – apenas cerca de 4% ou 5%”, afirmou a assessoria do pré-candidato. “O mesmo estudo, divulgado pelo Ministério da Justiça, aponta que 158.319 inquéritos instaurados até 31 de dezembro de 2007 estão praticamente parados (dados do Conselho Nacional de Justiça). A conclusão do trabalho: o percentual de impunidade para os homicídios é de 92%.”

O Truco já mostrou que a informação de que 92% dos homicídios não são solucionados aparece no relatório da Estratégia Nacional de Justiça e Segurança Pública (Enasp), vinculado ao Conselho Nacional do Ministério Público. O documento, por sua vez, credita o número à Associação Brasileira de Criminalística. Waiselfisz, citado como fonte pela assessoria de Flávio Rocha, reproduziu esse dado em entrevistas. O presidente da Associação Brasileira de Criminalística, Bruno Telles, atribui o número a um estudo do pesquisador Michel Misse.

Misse, no entanto, rejeita o número que lhe é atribuído. Em novembro de 2017, o Instituto Sou da Paz tentou calcular o porcentual nacional, mas apenas seis estados enviaram dados. O Ministério da Justiça produziu o estudo “A investigação de homicídios no Brasil”, em parceria com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, que traz apenas taxas de esclarecimentos em diferentes estados.

Em relação aos assaltos à mão armada, a assessoria do pré-candidato alegou que a afirmação foi baseada em uma reportagem do jornal Extra de junho de 2017. O texto calcula que o estado do Rio registra, para cada investigação sobre roubos solucionada pela Polícia Civil, 53 outros casos do tipo. A assessoria também credita o dado ao sociólogo Ignácio Cano, do Laboratório de Análise de Violência da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). O pesquisador teria feito um estudo mostrando que 3% das ocorrências de roubos no estado do Rio resultaram em condenações.

O Truco não localizou o estudo de Cano, tampouco conseguiu contato por telefone com a Uerj. Na matéria do Extra, o pesquisador afirma que a pesquisa foi publicada no final da última década, usando dados dos anos anteriores. Os números seriam, portanto, muito antigos para refletirem a situação atual. As fontes apresentadas por Rocha refletem os dados do estado do Rio, e não do Brasil todo. Além disso, os números são relativos a roubos de todo tipo, não apenas assaltos a mão armada.

De acordo com Ana Carolina Pekny, pesquisadora do Instituto Sou da Paz, assim como não existe um índice nacional de esclarecimento de homicídios, também não existe uma taxa nacional de solução de roubos a mão armada. “Na verdade, por mais bizarro que seja, sequer temos o número total de roubos cometidos no país, pois o Anuário Brasileiro de Segurança Pública se limita a algumas categorias de roubo”, explica.

No boletim trimestral Sou da Paz Analisa, feito pela organização a partir das estatísticas divulgadas pela Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo, há dados que pintam um cenário diferente para o estado de São Paulo em relação aos dados obtidos pelo candidato para o Rio, ao menos em relação aos roubos seguidos de morte. “Houve 47 prisões em flagrante por latrocínio no estado no ano passado, ante 334 ocorrências. Isso quer dizer que ao menos 14% dos roubos seguidos de morte no estado não ficam impunes”, afirma. “Digo ao menos porque há prisões por mandado também, ou seja, outras ocorrências podem ter acabado em prisão além dessas.”


“A política do desarmamento trouxe consequências péssimas: não deu certo.”

Falso

É incorreto afirmar que o Estatuto do Desarmamento “trouxe consequências péssimas” e “não deu certo”. Desde que foi promulgado, em 2003, o índice de homicídios no Brasil caiu em pelo menos cinco ocasiões, segundo os dados do Atlas da Violência 2017, estudo anual publicado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Entre 2014 e 2015, último ano que o Atlas abrange, a queda foi de 2,3%. Além disso, há estudos e relatórios confiáveis cujos dados sugerem que as campanhas de desarmamento tiveram resultados positivos. A afirmação de Flávio Rocha é falsa.

Questionada sobre as fontes da informação apresentada, a assessoria de imprensa do pré-candidato atribuiu o dado a uma reportagem do jornal Gazeta do Povo publicada em outubro de 2017. A matéria compara a quantidade de armas legalizadas existentes nos Estados Unidos e no Brasil, relacionando este número à taxa de homicídios a cada 100 mil habitantes. De acordo com o texto, com 10% das armas dos Estados Unidos, o Brasil tem taxa de homicídios com armas de fogo cinco vezes maior. Os vêm da pesquisa Small Arms Survey.

No entanto, a própria reportagem da Gazeta do Povo rebate a argumentação de que o desarmamento teve “consequências péssimas”. “Um estudo mais relevante, por envolver uma amostra maior – 27 países desenvolvidos – foi publicado em 2013 no American Journal of Medicine, e determinou que, embora a posse de armas por civis não afete a criminalidade geral, ela eleva a taxa de mortes por armas de fogo”, diz trecho da matéria. A reportagem cita ainda um estudo no qual os autores relacionam o número de armas per capita a um maior número de mortes por armas de fogo.

A assessoria de imprensa de Flávio Rocha disse ainda que a declaração do pré-candidato é “corroborada por opiniões como a do juiz do 3º Tribunal de Júri do Rio de Janeiro, Alexandre Abrahão, que afirma que o Estatuto do Desarmamento se mostrou totalmente ineficaz ao longo dos últimos 13 anos para impedir mortes violentas no país”. A declaração do juiz não é traz dados que a comprovem.

O índice de homicídios a cada 100 mil habitantes caiu em relação ao ano anterior em cinco ocasiões desde a promulgação do Estatuto do Desarmamento: de 2003 para 2004, de 2004 para 2005, de 2006 para 2007, de 2010 para 2011 e de 2014 para 2015.

Além das quedas na taxa de homicídios a cada 100 mil habitantes, o índice de homicídios por arma de fogo também registrou redução em relação a 2003. O Atlas atesta que no período imediatamente posterior à aprovação do Estatuto de Desarmamento, entre 2003 e 2007, houve queda nas mortes por armas de fogo no Brasil. No ano de 2013, quando o estatuto completou dez anos, a quantidade de homicídios com armas de fogo no país havia caído 12,6% em relação a 2003, quando a lei foi sancionada.

Um relatório feito pela Fundação Friedrich Ebert em parceria com o Instituto Sou da Paz e divulgado em 2015 traz outros resultados positivos. O documento conclui que o estatuto foi um fator importante para reverter o crescimento acelerado das mortes por arma de fogo no Brasil. Entre 1993 e 2003, a taxa de homicídios cometidos com armas de fogo por 100 mil habitantes crescia 6,9% ao ano. A partir de 2004, houve uma reversão de tendência, com o crescimento caindo para 0,3% ao ano.

Em outubro de 2017, o Truco entrevistou o pesquisador Daniel Cerqueira, responsável pelo Atlas da Violência. Para ele, é preciso isolar fatores econômicos e sociais para calcular apenas o impacto das armas de fogo na criminalidade. “Existem vários aspectos que influenciam na violência, desde taxas de escolaridade até a proliferação do tráfico de drogas. A violência pode aumentar ou diminuir de acordo com esses fatores, e isso não tem nada a ver com a eficácia do desarmamento”, esclarece. “É necessário isolar esses fatores em estudos sérios para concluir qual é, de fato, o efeito da arma de fogo nas taxas de criminalidade.”


“Os evangélicos hoje representam mais de 30% da população brasileira.”

Exagerado

O porcentual de evangélicos na população tem crescido nos últimos anos, mas não na proporção citada por Flávio Rocha. A assessoria do presidenciável informou que o dado foi retirado da pesquisa “Perfil e opinião dos evangélicos no Brasil”, do Instituto Datafolha, realizada entre os dias 7 e 8 de dezembro de 2016. O levantamento diz que 29% da população com mais de 16 anos é evangélica. Foram realizadas 2.828 entrevistas em 174 municípios, com margem de erro máximo de dois pontos percentuais para mais ou para menos.

Rocha afirmou que os evangélicos representam 30% de toda a população, mas a pesquisa do Datafolha diz que são 29% da população de 16 anos ou mais ­– o que é bem diferente. Usando as projeções do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para a população em 2016, conclui-se que o porcentual encontrado pelo instituto corresponderia a 22% do total de habitantes do país naquele ano. Logo, a afirmação é exagerada.

Resultado semelhante apareceu no Censo de 2010 do IBGE, em que 22,2% da população se considerava evangélica – em número absolutos, são cerca de 42 milhões de pessoas de zero a mais de 80 anos. O presidenciável acertou na tendência de avanço do crescimento do grupo no país. Entre o censos de 2000 e 2010, o número de evangélicos aumentou 61,45% no país.

No artigo “A dinâmica das filiações religiosas no Brasil entre 2000 e 2010: diversificação e processo de mudança de hegemonia”, publicado na Revista de Estudos da Religião em 2012, os autores José Eustáquio Diniz Alves, Luiz Felipe Walter Barros e Suzana Cavenaghi afirmam que, se o ritmo de mudanças das últimas décadas se mantiver, os católicos devem ficar abaixo de 50% nos próximos 20 anos, empatando com os evangélicos até 2040. “Os dados sócio-demográficos [do IBGE] reforçam a perspectiva de mudança na hegemonia religiosa no Brasil, já que os evangélicos estão melhor posicionados entre as mulheres, os jovens, a população urbana e entres as pessoas que se declaram pretas e pardas (que mais crescem no país)”, defende a pesquisa.

Em artigo para o Ecodebate, o demógrafo José Eustáquio Diniz Alves, co-autor do artigo citado acima e então professor de mestrado da Escola Nacional de Ciências Estatísticas (ENCE) do IBGE, explica que entendendo a tendência da transição religiosa entre 1991 a 2010, pode-se fazer uma projeção linear com os seguintes resultados para 2036: os evangélicos com 40,3% ultrapassarão os católicos com 39,4%. O pesquisador também realizou uma projeção linear para a pesquisa do Datafolha, notando que, de 1994 a 2016, os evangélicos crescem 0,68% ao ano, enquanto os adeptos ao catolicismo perdem 1,14% de fiéis ao ano. Nessa lógica, a população católica cairá para 22,7% em 2040 e a de evangélicos subirá para 45,4%.


“O meu estado [Pernambuco] tem 38% da população atendida pelo Bolsa Família.”

Verdadeiro

Apesar de ter opiniões liberais e não intervencionistas, Flávio Rocha afirmou, na entrevista para a TV Folha, não ter intenção de acabar com o programa Bolsa Família caso seja eleito. Para embasar a sua opinião, ele disse que 38% da população de seu estado, Pernambuco, é atendida pelo programa e que ele é necessário. O dado apresentado, apesar de não ser preciso, está dentro das estimativas. Por isso, foi considerado verdadeiro.

O Bolsa Família é um programa de transferência de renda realizado pelo Ministério do Desenvolvimento Social. O benefício é distribuído por família e varia de acordo com a renda mensal e a quantidade de filhos. Para se inscrever no programa, é preciso realizar o chamado Cadastro Único. A partir das famílias cadastradas, o governo avalia quais estão aptas ou não a receber o benefício e então distribui.

Uma pesquisa realizada pelo ministério, encomendada pelo jornal Valor Econômico, diz que 36% da população de Pernambuco é atendida pelo Bolsa Família. O estudo utiliza estimativas do IBGE de 2017 e foi apontado como fonte do dado citado pelo pré-candidato pela assessoria.

De acordo com o último Censo, a população de Pernambuco era de 8.796.448 em 2010. A estimativa mais recente realizada pelo IBGE diz que a população do estado girava em torno de 9,47 milhões em 2017. Assim, pelo estudo apontado, 3,4 milhões de pessoas eram beneficiadas pelo Bolsa Família em Pernambuco em fevereiro de 2018 – isso representaria 38,7% da população do estado calculada pelo Censo de 2010.

Contudo, como o programa é distribuído por unidade familiar e não por indivíduo, os dados disponíveis são sobre a quantidade de famílias beneficiadas, não pessoas. Assim, muitas pesquisas chegam a resultados diferentes sobre a porcentagem de pessoas que recebem o benefício em cada estado.

A pesquisa encomendada pelo Valor chegou ao número de beneficiários a partir do tamanho das famílias inscritas no programa, obtido através de dados no sistema interno do Ministério de Desenvolvimento Social. Em seguida, foi calculado quanto isso representa na população do município, estado ou região em questão a partir das estimativas do IBGE.

Dados oficiais apresentados no site do ministério usam outra metodologia e chegam a um resultado bastante diferente. Segundo o último relatório da Secretaria de Avaliação e Gestão da Informação, 1.150.786 pessoas foram beneficiadas pelo Bolsa Família em março de 2018. De acordo com o Relatório de Programas e Ações Sociais, isso representaria 45% da população do estado em comparação com o Censo 2010 ou 41,7% em comparação com estimativas de 2017.

Conforme informado pelo Ministério do Desenvolvimento Social ao Truco, o cálculo da porcentagem da população beneficiada no relatório é feito levando em consideração a composição média das famílias que recebem o Bolsa Família. À exceção do relatório de programas sociais, todas as outras estimativas oficiais indicam que a proporção de pessoas beneficiadas pelo Bolsa Família em Pernambuco está próxima dos 38% apontados por Rocha e dos dados da pesquisa encomendada pelo Valor Econômico.

A Secretaria Nacional de Renda de Cidadania, responsável pelos dados de programas de distribuição de renda, informou ao Truco que a média de pessoas por família beneficiária do programa no estado de Pernambuco é 2,96. O número difere da estimativa utilizada pelo Relatório de Programas e Ações Sociais. O órgão afirmou que, em abril deste ano, 3.462.367 pessoas foram beneficiárias do Bolsa Família em Pernambuco, que representa 36,5% da população do estado segundo a estimativa de 2017 do IBGE, ou 39,3% segundo o Censo de 2010.

A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua também realiza estudos sobre a quantidade de pessoas que declaram receber o Bolsa Família. De acordo com a Pnad, 731.237 domicílios em Pernambuco receberam o benefício em 2017. Os dados ainda indicam que a composição média dos domicílios que recebem o Bolsa Família no estado é de 4,6 pessoas. Assim, é possível concluir que aproximadamente 3,36 milhões de pessoas foram atendidas pelo Bolsa Família em Pernambuco. Isso representa 35,4% da população do estado segundo a estimativa de 2017 ou 38,2% segundo o Censo de 2010.

Alguns órgãos estaduais também possuem dados da quantidade de beneficiários do programa Bolsa Família. A Secretaria Estadual de Assistência Social de Pernambuco informou ao Truco que 3.392.266 pessoas foram beneficiadas no estado em março deste ano – última estatística disponível para o órgão. O número representa 35,8% da população estimada em 2017, e 38,5% da população registrada pelo Censo 2010. O dado está disponível no tabulador da Secretaria de Avaliação e Gestão da Informação do Ministério do Desenvolvimento Social.

Por mais que os números sobre a porcentagem de pessoas beneficiadas pelo Bolsa Família em Pernambuco varie de pesquisa para a pesquisa, na maioria delas ele está em torno de 36% em comparação com as estimativas do IBGE de 2017 ou 38,5% em comparação com o Censo de 2010. A única fonte que difere consideravelmente é a do Relatório de Programas e ações do Ministério do Desenvolvimento Social., mas esse estudo utiliza estimativas médias da composição das famílias, enquanto os outros utilizam dados concretos sobre a quantidade de pessoas que recebem o benefício sendo mais confiáveis. Portanto, a afirmação foi considerada verdadeira.

Atualização (15/05, às 13h): Após a publicação da checagem, a assessoria de Rocha enviou uma nota para contestar os selos de três frases.

Sobre a taxa de solução de homicídios e de assaltos a mão armada, em que usou dois dados falsos, foi reiterado que um dos números vem da Enasp: “O único dado disponível sobre resolução de homicídios vem da Enasp: 92% de elucidação. Todos os estudiosos e operadores do direito penal usam esse dado. A estatística de 98% de assaltos não resolvidos baseia-se na amostra da situação do Rio de Janeiro, que indicou, na verdade 1,88%. Nada indica que nos outros estados a situação seja melhor. Quanto à fonte mencionar “qualquer tipo de roubo”, os promotores, procuradores, juízes e policiais informam que, na prática, a esmagadora maioria dos roubos ocorre com o uso de armas. O roubo sem arma praticamente inexiste nos registros policiais. Observe-se ainda que para cada roubo – ou assalto – registrado em uma delegacia de polícia ocorrem vários outros que nunca são notificados. Nos Estados Unidos, segundo o documento Sourcebook of Criminal Justice Statistics, 2000, p. 208, do U.S. Department of Justice, o percentual de subnotificação de roubos é de 40%. No Brasil, provavelmente, esse número deve ser muito maior. Observem que quando uma agência de fact-checking afirma que “não há um dado nacional de resolução de homicídios” – querendo dizer na verdade que não há um índice oficial – percebe-se claramente que não se trata de um trabalho de apuração de fatos, e sim de uma mentalidade burocrática: se o índice não é “oficial”, ou seja, não está previsto numa lei, decreto, resolução, portaria, então ele “não existe” para os burocráticos “checadores”. Não existe um “índice nacional oficial” de homicídios praticados por homofobia ou por racismo, por exemplo. Isso nunca impediu que esses mesmos checadores de fatos divulgassem que no Brasil são mortas tantas pessoas por homofobia ou tantas por racismo. Vocês estão usando dois pesos e duas medidas.”

Já em relação à frase falsa em que Rocha diz que o Estatuto do Desarmamento não deu certo, a resposta foi a seguinte: “Há muitas afirmações questionáveis no Mapa da Violência. Uma delas, presente nas suas duas últimas edições, ganhou as páginas de quase todos os jornais recentemente: o Estatuto do Desarmamento teria salvo milhares de vidas. Na edição de 2016, há um gráfico sobre homicídios por armas de fogo, na página 67. O ápice da bifurcação marca o ano de aprovação do Estatuto do Desarmamento. A linha mais escura mostra a realidade registrada até 2014. A linha mais clara é uma projeção de como teria sido sem o Estatuto. O cálculo dessa projeção foi feito pelo crescimento de homicídios por armas de fogo registrado entre 1991 e 2003, que foi de 129,2%, o que equivale a um crescimento anual de 7,8%. Esse foi o índice utilizado para projetar o futuro alternativo. Qualquer observador atento perceberá que o gráfico terá “vida” curta como intervenção no debate público. Ele foi feito para gerar manchetes de jornal. Isto porque, mantida a projeção, a linha mais clara dará resultados absurdos nos anos subsequentes. Por exemplo, em 2024 seriam 116 mil homicídios por armas de fogo; em 2034, 247 mil; e em 2044, 525 mil. Meio milhão de pessoas! Finalmente, no aniversário de cem anos do Estatuto, os brasileiros teriam muito o que comemorar: 44 milhões de vidas salvas em apenas um ano. Ainda que a linha projetada (mais clara) seja tecnicamente, digamos, exótica, é fato que a linha escura mostra que houve uma queda na velocidade do crescimento dos homicídios por armas de fogo a partir de 2003. Do ponto de vista científico, caberia investigar a relação dessa queda com o Estatuto do Desarmamento. Infelizmente, na grande maioria dos estudos sobre o tema (e o Mapa da Violência não é diferente) a relação não é comprovada, ela é suposta: se houve queda, ela foi causada pelo Estatuto e, sobretudo, ele foi a única causa. Por quê? Porque houve queda. No entanto, quando, ao invés de queda, os indicadores de homicídios por armas de fogo registram crescimento, os autores desses mesmos estudos costumam afirmar que outros fatores interferiram. Não teriam outros fatores interferido quando houve queda? Não costuma haver resposta. As interpretações benevolentes dos (supostos) benefícios do Estatuto do Desarmamento – dogmáticas, aliás – geralmente produzem pontos cegos nos estudos. O próprio gráfico acima esconde muitos deles. O gráfico informa que houve queda na taxa nacional de crescimento de homicídios por arma de fogo após 2003. Entretanto, quando se observam os dados por estado (Mapa da Violência 2016), percebe-se que na grande maioria deles não houve queda, pelo contrário. No período 2004/2014, estados como o Rio Grande do Norte, Maranhão e Ceará registraram aumentos de homicídios por armas de fogo de 379,8%, 300% e 268,2%, respectivamente. De fato, houve queda em apenas seis deles: São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Minas Gerais, Pernambuco e Mato Grosso do Sul. Em São Paulo, a queda foi de 57,7%; no Rio, de 47,8%. Como São Paulo é o estado mais populoso do Brasil, a queda registrada, que teve início antes do estatuto, derrubou a velocidade de crescimento da taxa nacional de homicídios por armas de fogo. Os pontos cegos, as hipóteses não testadas, os dogmas e os slogans que permeiam muitos estudos sobre o tema no Brasil têm uma causa óbvia frequentemente ignorada: os indivíduos que militam em favor do desarmamento também produzem os estudos “científicos” sobre os impactos do desarmamento na sociedade brasileira. Além disso, são eles que delimitam o espaço crível desse debate. Quase todos os estudos que chegam à imprensa sobre esse tema – e eles chegam muito rapidamente – foram patrocinados ou apoiados por ONGs como o Instituto Sou da Paz, que defende o desarmamento. Do ponto de vista da transparência e em defesa da qualidade do debate público, é desejável que os leitores ou os telespectadores sejam informados disso.”

A assessoria voltou a afirmar que o dado exagerado de Flávio Rocha sobre os evangélicos está correto, embora ele tenha se referido a toda a população brasileira (não apenas aos maiores de 16 anos): “Como argumentamos na resposta à agência, segundo pesquisa do Datafolha, divulgada em 2016, 29% dos brasileiros com mais de 16 anos são evangélicos. O crescimento da população evangélica no Brasil é exponencial. O número de evangélicos aumentou 61,45% em 10 anos, segundo o IBGE. O crescimento foi registrado no último levantamento, de 2010, em comparação com o Censo anterior, realizado em 2000. A último censo apontou que 22,2% dos brasileiros eram evangélicos em 2010. Já se passaram oito anos. O próximo Censo do IBGE será divulgado em 2020.”

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