SANTARÉM — Os dois candidatos a prefeito das eleições que concentram as maiores atenções em Santarém, no Pará, segundo pesquisas divulgadas por meio de comunicação da região, são Zé Maria Tapajós (MDB), apoiado pelo governador Helder Barbalho (MDB), e JK do Povão (PL), um bolsonarista, filho de um ex-prefeito, que nos últimos dez anos ganhou fama na cidade ao comandar um blog com supostas denúncias contra a prefeitura.
JK está na oposição ao atual prefeito, Nélio Aguiar (União Brasil), que, no cargo de prefeito há quase oito anos, não pode mais se candidatar à reeleição e agora apoia o nome do MDB, Zé Maria Tapajós. Trata-se do candidato do sistema político mais tradicional da região.
Além de ter o apoio do atual prefeito e do governador do estado, ele fechou uma aliança com o PT e, por extensão, com o governo federal, que abriga um irmão de Helder, Jader Filho, como ministro das Cidades. A coligação é uma verdadeira salada ideológica. Agrega PT, MDB e várias siglas da direita, como o União Brasil, o PP (Partido Progressista), o Republicanos, o Podemos, o DC e o PSD, sem deixar de fora o PSB, o PC do B e o PV.
Os dois candidatos, ambos com ligações com o agronegócio, não quiseram falar com a Agência Pública sobre meio ambiente, alegando compromissos de campanha.
O arco de alianças gerou uma frustração em parte da militância do partido, conforme dois candidatos a vereador do PT contaram à Pública. Antes, havia um nome aguardado como a candidata “natural” à prefeitura, a deputada estadual e ex-promotora de justiça Maria do Carmo (PT), que foi prefeita de Santarém por duas vezes (2005-2008 e 2009-2012).
Os partidos de esquerda aguardavam a definição desse nome pelo PT para se unir numa frente à esquerda, disse Maike Kumaruara, do diretório municipal do PSOL em Santarém. Contudo, por volta de março passado a pré-candidatura da deputada foi deixada de lado em meio às costuras políticas do clã Barbalho e de outros aliados de Zé Maria, como o ex-prefeito e ex-deputado federal Joaquim Lira Maia, uma espécie de eminência parda da política na região.
Por que isso importa?
- A Agência Pública está percorrendo a BR-163, entre os estados de Mato Grosso e Pará, e o município de Santarém é um dos locais dessa rota onde nossa equipe investiga como o tema das mudanças climáticas e meio ambiente vem sendo discutido nas eleições municipais. A região é extremamente marcada por fogo, conflitos e desmatamento, com cidades que registram grande adesão ao bolsonarismo.
Ao final das conversas políticas, um irmão de Maria do Carmo, o vereador Carlos Martins (PT), foi lançado pelo PT como vice de Zé Maria. Nos lados do MDB, Lira Maia é tio do deputado federal Henderson Pinto (MDB), que vem a ser o presidente do diretório do MDB em Santarém.
Lira Maia é dono da AgroSanta, uma empresa que justamente comercializa agrotóxicos em toda a região. Para o PSOL, o ex-deputado foi um dos responsáveis “por trazer a soja” para o Baixo Amazonas – a Pública tentou ouvir Maia em sua casa, mas ele não foi encontrado.
A Pública apurou que o comando do PT em Santarém disse a alguns candidatos e integrantes do diretório que a aliança com a direita e o MDB era necessária como estratégia política para “dar alguns passos atrás e depois avançar”, a fim de derrotar o bolsonarista JK, e também porque Maria do Carmo corria o risco de perder a eleição, o que poderia fragilizar o partido no município. A Pública procurou Maria do Carmo por telefone, mas não houve retorno até a publicação.
O fechamento da aliança levou o PSOL a desistir de se coligar com o PT, rompendo a proximidade que tiveram na campanha presidencial de Lula em 2022.
“A gente apostava muito [em Maria do Carmo] para continuar num bloco de esquerda porque a gente precisa derrotar a extrema direita. Porque Santarém é tipo a última fronteira do agronegócio. Mas o PT resolveu fazer um acordo com os Barbalho, fez uma política de interesses pra dentro da tendência da Maria. E aí não tem como a gente ir junto com o Lira Maia, que é o cara que trouxe o agronegócio pra cá. A gente acha que o agronegócio é responsável por esse caos climático, essa onda de queimadas. O mundo tá acabando, e a política é uma saída pra isso, né?”, disse Kumaruara.
De forma contraditória, o tema do meio ambiente desapareceu das duas principais campanhas eleitorais à prefeitura neste ano, como mostramos na reportagem “Enquanto a soja avança, clima e meio ambiente somem das eleições em Santarém”.
A exceção é a candidata do PSOL em coligação com a Rede, em que a professora Izabel Sales defende uma política do “bem viver”. Ela disse à Pública que o debate sobre meio ambiente está “silenciado” porque os outros dois principais candidatos estão ligados ao agronegócio.
Helder Barbalho é uma figura presente em praticamente todos os programas eleitorais de Zé Maria em Santarém. Embora governador do estado anfitrião da COP 30 no ano que vem, a ser realizada em Belém, Helder Barbalho é um entusiasta da produção de soja no Baixo Amazonas. No ano passado, ele participou do ato de “abertura nacional” da colheita de soja, que pela primeira vez foi realizado no Pará. O ato ocorreu justamente na fazenda de Avelino Noimann, o pai da candidata a vice com JK do Povão, em uma demonstração de como a política na região circula em poucas mãos.