O anúncio feito pelo presidente Lula nesta terça-feira (21) de que o embaixador André Corrêa do Lago vai presidir a 30ª Conferência do Clima da ONU, que será realizada em Belém, a COP30, sinaliza uma preocupação com o sucesso da cúpula, que ocorre em novembro em meio a um momento de incertezas sobre os rumos do combate às mudanças climáticas em todo o planeta.
A decisão, há muito aguardada, foi tomada um dia após Donald Trump ter assumido a presidência dos Estados Unidos e já anunciado a retirada do país do Acordo de Paris, em que praticamente todas as nações do mundo se comprometeram a reduzir suas emissões a fim de conter o aquecimento global.
Mesmo com os EUA a bordo, porém, o cenário já estava ruim. O tratado completa dez anos em dezembro em meio à contínua elevação da temperatura do planeta (o ano passado foi o mais quente do registro histórico). Ano a ano, as conferências do clima trazem avanços muito lentos, que não têm conseguido fazer frente ao problema.
Na COP passada, em Baku, chegou-se a um acordo sobre um novo valor de financiamento climático – US$ 300 bilhões –, que é muito inferior ao considerado necessário para que os países em desenvolvimento façam suas ações de mitigação e adaptação.
O resultado, considerado por muitos um fracasso, jogou para a COP do Brasil a responsabilidade de recolocar o mundo no trilho correto. É necessário mobilizar os recursos, mas também recuperar um sentimento de confiança entre os países – abalada pelo próprio processo das conferências, mas também agora pela saída dos Estados Unidos.
Após dois anos em que as conferências climáticas foram lideradas por políticos que fizeram carreira na indústria de petróleo, a COP em Belém terá à frente um nome historicamente comprometido com o tema. Lago, que é secretário de Clima, Energia e Meio Ambiente do Itamaraty desde o início do terceiro mandato de Lula, já chefiou a delegação brasileira de negociadores em diversas COPs e trabalha com desenvolvimento sustentável desde 2001.
Economista, entrou na carreira diplomática em 1982. Ele foi diretor do Departamento de Energia (2008-2011) e do Departamento de Meio Ambiente (2011-2013) do Itamaraty e negociador-chefe do Brasil na Rio+20 (2011-2012). Foi embaixador no Japão (2013-2018), na Índia (2018-2023) e, cumulativamente, no Butão (2019-2023).
Considerado um habilidoso negociador, Lago é respeitado por especialistas em clima e por diplomatas de outros países. Costuma ser chamado para ajudar a destravar as negociações climáticas em momentos críticos, principalmente a fazer pontes entre países desenvolvidos e em desenvolvimento.
É exatamente o que se espera de um presidente de COP. Cabe ao ocupante do cargo dar o tom das negociações, desatar nós, aparar arestas, resolver conflitos, chacoalhar os negociadores para tomar uma decisão. Em muitos anos, foi à presidência que se atribui o sucesso ou o fracasso da cúpula.
Ao seu lado, Lago terá Ana Toni, atual secretária de Mudança de Clima do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, que será e diretora-executiva da COP30.
A liderança desempenhada pela dupla terá um desafio ainda mais crítico neste ano, quando se espera que os países assumam novas metas de redução de emissões e mostrem como vão avançar na questão do financiamento, tendo de resolver problemas da COP passada e preencher o vácuo deixado pelos EUA. Caberá ao Brasil mobilizar os países para assumirem um maior compromisso com o planeta – que seguirá rumo a um aquecimento de 3 °C se medidas mais ambiciosas não forem tomadas.
Um documento publicado nesta segunda pela organização Política por Inteiro, do Instituto Talanoa, explica por que o cargo é tão importante: “A presidência da COP exige grandes habilidades de negociação, para conciliar interesses de países desenvolvidos e em desenvolvimento, de grandes nações continentais e pequenos territórios insulares. No cargo, não se pode agir como representante de uma Parte [um país]. É necessário ser imparcial na busca por consenso e avanço nos compromissos climáticos”.
“A escolha do embaixador Corrêa do Lago mostra que Lula está comprometido com o sucesso da COP30, indo além do progresso incremental. Este será um momento para redefinir a trajetória da governança climática global, e a experiência diplomática de Corrêa do Lago é crucial para conduzir negociações complexas e entregar os avanços que o mundo precisa”, disse à Pública Natalie Unterstell, presidente do Talanoa.
“Corrêa do Lago tem diante de si uma agenda desafiadora, num momento em que o aquecimento da Terra ultrapassa o limite do Acordo de Paris ao mesmo tempo em que a geopolítica se volta contra a ação climática e contra a cooperação internacional”, comentou, por meio de nota, a rede de ONGs Observatório do Clima.