“Aos que criticam o projeto por entendê-lo como uma simples facilitação a empresas estrangeiras, quero alertar sobre o conteúdo do art. 12 da Lei nº 12.351, que remete ao Conselho Nacional de Política Energética a possibilidade de propor que a Petrobras seja contratada diretamente pela União para exploração e produção de petróleo, sob o regime de partilha de produção, sempre que a preservação do interesse nacional assim o exigir. Assim, sempre que o interesse nacional estiver em jogo, continuará sendo possível dar prioridade à Petrobras.” – Lúcia Vânia (PSB-GO)
A afirmação da senadora Lúcia Vânia (PSB-GO) está correta, só que não há qualquer garantia de que isso aconteça no futuro. O artigo 12 da Lei nº 12.351 diz que a Petrobras será contratada pela União sempre que o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) alegar a necessidade de preservação do interesse nacional ou de atendimento da política energética. Isso traz, contudo, dois problemas. O primeiro é a composição do CNPE, que mudará sempre que houver um novo presidente, por exemplo. O segundo ponto é a capacidade de a Petrobras fazer esses investimentos no momento em que isso for exigido pelo conselho.
O CNPE é composto por 14 integrantes. Desses, nove são ministros, três são nomeados pelo presidente da República, com mandato de dois anos renovável por mais dois – um representante dos Estados e do Distrito Federal, um representante da sociedade civil especialista em energia e um representante da universidade brasileira, também especialista no tema –, outro é o presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e o outro é o secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia. Isso significa que a composição do CNPE sempre reflete o perfil de quem está no poder e, portanto, está sujeita a diferentes interpretações sobre o que é “preservação do interesse nacional” ou o que é prioridade para “atendimento da política energética”.
A outra questão tem a ver com a própria situação financeira da Petrobras. Hoje, a empresa tem uma dívida bruta que, no terceiro trimestre do ano passado, atingiu R$ 506,5 bilhões. Isso afeta a capacidade de fazer novos investimentos e de explorar novos campos, como os do pré-sal. Ao mesmo tempo, o pré-sal pode ajudar a Petrobras a se recuperar financeiramente. Como o projeto aprovado no Senado tira da empresa a obrigatoriedade de participar na exploração, ela pode ser substituída por concorrentes em um momento delicado. E o próprio CNPE pode optar por não propor a sua contratação enquanto a situação financeira da empresa estiver ruim. Ou seja, vários dos novos campos do pré-sal poderão ser licitados para outras empresas e, mesmo depois de se recuperar, a Petrobras estará excluída da exploração nessas reservas.
“O pré-sal foi descoberto em 2006, e, agora, em 2016, já estamos, pelo pré-sal, produzindo quase um milhão de barris/dia. Depois de 10 anos, nem 10 anos completos, já estamos produzindo um milhão de barris/dia. E o pré-sal é a principal fonte de lucro hoje da Petrobras.” – Gleisi Hoffmann (PT-PR)
O pré-sal nunca atingiu a produção de um milhão de barris por dia, segundo os dados mais recentes da Petrobras. De acordo com a empresa, a extração média, em 2015, foi de 767 mil barris por dia, muito longe do 1 milhão apontado pela senadora.
Conforme avançam os trabalhos na região, entretanto, o volume de petróleo retirado desta camada tem crescido. No ano passado, a produção no pré-sal cresceu 56% em relação a 2014. O recorde diário registrado até hoje na região foi de 942 mil barris por dia, em dezembro de 2015, e é possível que em 2016, como aponta a senadora, chegue-se à simbólica marca de 1 milhão de barris por dia.
De toda forma, o montante corresponde a menos da metade da produção de petróleo da estatal, o que invalida o argumento que a camada é a principal fonte de lucro da Petrobras. A empresa foi procurada pela reportagem, mas se limitou a dizer que não comenta a participação do pré-sal em seus lucros.
“O custo da Petrobras na extração do petróleo do pré-sal não é de US$ 8, senadora [Gleisi Hoffmann]. Eu fiz o cálculo do custo médio do barril de petróleo no ano passado, de janeiro a setembro, que é, em boa medida, fora do pré-sal, onde tende a ser mais barato, porque o pré-sal é uma região mais difícil, águas profundas. O custo médio da Petrobras por barril foi de US$ 32.” – José Serra (PSDB-SP)
Em seu discurso, o senador José Serra (PSDB-SP) acusou colegas petistas de usarem dados fornecidos por sindicalistas e que apontariam o custo de US$ 8 por barril no pré-sal. O tucano não explicou como fez a conta para refutar o preço, ou mesmo que base de dados utilizou. Como pontuou a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), os US$ 8 são o valor oficial da própria Petrobras, não de sindicatos. Segundo a companhia, enquanto o custo de extração do pré-sal é de US$ 8 dólares por barril, a média nacional é de US$ 14 dólares – bem abaixo dos US$ 32 apontados pelo senador paulista.
Além disso, a base da argumentação de Serra é que, por ser de difícil acesso, o pré-sal necessariamente produzirá um petróleo caro. Conforme contra-argumentou Hoffmann e como têm dito representantes da Petrobras, é a quantidade que reduz os preços de produção na região. No final de 2015, 10 anos após a descoberta, o pré-sal chegou ao recorde de 942 mil barris por dia, ou cerca de 41,5% da produção total da companhia.
“Como o Brasil vai cumprir as metas do Plano Nacional de Educação se parte dele se prevê com investimentos saídos do pré-sal? E a Petrobras não tem condições.” – Cristovam Buarque (PPS-DF)
A crise institucional que afeta a Petrobras, causada pelas investigações da operação Lava Jato, a queda no preço do barril de petróleo e a enorme dívida da empresa são fatores que comprometem a capacidade de investimento em novas jazidas do pré-sal. A preocupação do senador Cristovam Buarque (PPS-DF), por isso, tem fundamento. Mas o investimento de outras empresas no pré-sal também não é suficiente para garantir o cumprimento das metas do Plano Nacional de Educação (PNE).
O programa prevê a elevação crescente dos gastos públicos em educação, em relação ao Produto Interno Bruto (PIB), até 2024. De acordo com o texto, o Brasil deverá investir 7% do PIB nessa área até 2019. Em 2024, o porcentual deve chegar a 10%. É uma meta ambiciosa, que depende de múltiplos fatores para ser atingida. Em 2013, o porcentual do PIB gasto com educação havia atingido 6,6%. Estaria, portanto, perto de alcançar a meta definida para 2019 no PNE. Isso, contudo, já pode ter mudado.
Os royalties do pré-sal são apenas uma das receitas que podem ajudar a alcançar esse objetivo. E as flutuações do preço do barril do petróleo têm influência direta nisso. Hoje, a cotação está em cerca de US$ 36. Em junho de 2014, época em que o PNE foi sancionado, chegou a ser três vezes maior (US$ 112). Em outubro do ano passado, o ministro da Educação, Aloizio Mercadante, afirmou que a queda no preço do petróleo reduziria pela metade a destinação de recursos prevista para um fundo dessa área.
A própria arrecadação é outro fator importante a ser levado em conta, uma vez que a Constituição determina a destinação de um porcentual fixo para essa área (18%). A queda na arrecadação e o ajuste fiscal podem impossibilitar a destinação de um valor maior para essa área, que ajudaria a cumprir as metas do PNE.
“[A Petrobras] não está acabada, ela não está falida, ela teve lucro operacional. E graças a quê? Graças à exploração do pré-sal.” – Vanessa Grazziotin (PCdoB – AM)
Embora o pré-sal tenha participação crescente no volume de petróleo produzido pela Petrobras, é equivocado atribuir a ele o lucro operacional atingido pela estatal. Em dezembro de 2015, por exemplo, a empresa produziu em média 2,27 milhões de barris por dia – incluídas outras fontes no Brasil e no exterior. Mesmo considerando o recorde de produção do pré-sal em 2015, atingido em dezembro, de 942 mil barris por dia, isso corresponde a apenas 41,5% da produção da Petrobras no mesmo período.
De fato, o lucro operacional da empresa cresceu quando a exploração do pré-sal começou a ganhar mais robustez, atingindo R$ 28,635 bilhões entre janeiro e setembro de 2015 – um aumento de 149% em relação ao mesmo período de 2014, segundo apontam os resultados consolidados da empresa no terceiro trimestre do ano passado. Porém, o cálculo do montante e a comparação entre os dois períodos leva em conta outros fatores, como a produção de gás natural e, principalmente, a forte subida da cotação do dólar.
“O WikiLeaks assegurou (…) que o senador Serra havia prometido acabar com o sistema brasileiro, que havia prometido a empresas estrangeiras e à embaixadora americana.” – Roberto Requião (PMDB-PR)
A posição do senador José Serra (PSDB-SP) sobre o pré-sal, mencionada pelo senador Roberto Requião (PMDB-PR), é citada em um telegrama enviado a Washington em 2 de dezembro de 2009, revelado pelo WikiLeaks durante o Cablegate. O texto do documento, contudo, menciona uma fonte secundária, que relata uma conversa que o parlamentar teria mantido com empresas da área do petróleo. Logo, não é possível assegurar com 100% de certeza que Serra tenha dito que acabaria com o sistema.
De acordo com o telegrama, a chefe de relações governamentais da Chevron, Patricia Pradal, atribuiu a seguinte frase ao tucano, falada em um encontro com representantes da indústria: “Deixa esses caras (do PT) fazerem o que eles quiserem. As rodadas de licitações não vão acontecer, e aí nós vamos mostrar a todos que o modelo antigo funcionava… E nós mudaremos de volta.” Serra estaria defendendo o modelo de concessões e se posicionando contra o modelo de partilha. O projeto 131/2015 flexibilizou o sistema de partilha, mas não o modificou.
Em nenhum momento o telegrama diz que Serra seria contrário ao pré-sal ou cita alguma conversa com a embaixadora americana – o que invalida a afirmação de Requião. O senador teria afirmado a outros parlamentares, segundo contaram representantes do Congresso a funcionários da embaixada, que era importante fazer emendas à lei, não contestá-la diretamente. Mais uma vez, não se trata de uma fonte primária.