“A carga tributária do Canadá é semelhante à brasileira, em torno de 34%, 34,5%. (…) No Canadá, não existe miséria, a população é inteiramente assistida, os serviços públicos funcionam, a saúde funciona, a educação é pública e gratuita, a Justiça também é pública.” – João Capiberibe (PSB-AP), em discurso no Senado, no dia 21 de junho
O senador João Capiberibe (PSB-AP) fez uma comparação entre Brasil e Canadá para justificar seu voto favorável a um projeto que amplia o enquadramento de empresas no Supersimples. A principal mudança da proposta, que foi aprovada em primeiro turno no Senado, é a elevação do teto anual para empresas de pequeno porte (EPP) de R$ 3,6 milhões para R$ 4,8 milhões. Mas Capiberibe derrapou em seu discurso ao dizer que “a carga tributária do Canadá é semelhante à brasileira”. Na verdade, ela é menor. A frase foi verificada pelo Truco no Congresso – projeto de fact-checking da Agência Pública feito em parceria com o Congresso em Foco.
Em 2013, o índice canadense foi de 30,5%, segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), ante 35,95% no Brasil, de acordo com dados da Receita Federal. Apesar de possuir a maior carga tributária da América Latina, o Brasil mantém um índice comparável ao dos países ricos da OCDE – grupo das 34 economias mais desenvolvidas do mundo, que inclui a brasileira –, onde a média de impostos equivale a 34,4% do PIB. Procurado pela reportagem, o gabinete do senador afirmou que o dado utilizado é da OCDE, porém está desatualizado: 34,5% era o valor da carga tributária no Canadá em 1994.
O senador afirmou ainda que “não existe miséria no Canadá”. De fato, o país norte-americano sequer se encontra no estudo anual do Banco Mundial que estima a população mundial vivendo abaixo da linha da pobreza. Por esse motivo não há dados precisos para compará-lo ao Brasil. Segundo a instituição, 4,9% da população brasileira vivia na miséria em 2013, ou seja, com menos de US$ 1,90 por dia.
No Canadá, embora não haja estatísticas sobre miséria, 13,5% da população é considerada de baixa renda pelo governo por possuir rendimentos inferiores a metade da média nacional. Como a renda familiar média é de 76.500 dólares canadenses por ano, o parâmetro canadense é muito distante do utilizado para delimitar a linha da pobreza, de US$ 1,90 por dia. Ainda assim, 850 mil canadenses são auxiliados todos os meses por bancos de alimento, boa parte deles no norte do país, onde a oferta de comida é menor e os preços, mais altos.
Em análise bastante subjetiva, o senador afirmou também que, no Canadá, “a saúde funciona”. Não há pesquisas recentes e abrangentes sobre a qualidade dos diferentes sistemas de saúde pelo mundo. A última, realizada pelo OMS, data do ano 2000. Por isso, o Truco no Congresso conversou com cidadãos canadenses que confirmaram que o sistema é eficiente, embora em cidades grandes esteja sobrecarregado, o que gera filas. Em um ranking qualitativo de 2014 feito pelo Commonwealth Fund, o sistema de saúde do Canadá ficou em 10º lugar dentro de um grupo de 11 países desenvolvidos, à frente apenas dos Estados Unidos.
Em seu discurso, Capiberibe disse ainda que a educação no Canadá “é pública e gratuita”. No entanto, esse cenário é verdadeiro somente para estudantes do 1º ano até o final do high school, nível equivalente ao ensino médio no Brasil. O ensino superior é sempre pago. O custo médio de uma universidade ou faculdade no Canadá para residentes é de 6.191 dólares canadenses por ano, segundo dados recentes do governo. Os gastos dos estudantes com ensino superior podem ser facilitados por meio de empréstimos, subsídios e créditos fiscais concedidos individualmente.
O gabinete do senador foi procurado novamente pelo Truco e informado sobre o resultado da checagem, que mostrou que a afirmação estava exagerada. Não houve resposta, no entanto, no prazo estipulado.