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CPT: Brasil teve pico de tentativas de homicídio, intimidação e ameaça a indígenas em 2024

23 de abril de 2025
10:00

O ano de 2024 foi marcado pelo agravamento das violências contra povos e comunidades do campo no Brasil. Apesar da redução no número de assassinatos consumados — 13 casos, o menor da década —, o país registrou o maior número de ameaças de morte dos últimos dez anos: 272 ocorrências, um aumento de 24% em relação a 2023. Também cresceram as intimidações (223) e as tentativas de assassinato (103), com um dado particularmente grave: 79% das vítimas dessas tentativas eram indígenas, principalmente no Mato Grosso do Sul.

A maior parte dos assassinatos e da violência extrema se concentrou em áreas de expansão agrícola. Das 13 mortes registradas, oito ocorreram em regiões como a Amazônia Legal, Amacro (Acre, Amazonas e Rondônia) e Matopiba (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia). Em quatro delas, forças policiais atuaram como executoras ou apoiadoras dos crimes.

Os dados fazem parte do relatório anual da Comissão Pastoral da Terra (CPT), que contabilizou 2.185 conflitos no campo ao longo de 2024 — o segundo maior número desde o início da série histórica, em 1985, ficando atrás apenas de 2023, que registrou 2.250. O levantamento revela um cenário de violações sistemáticas e ataques coordenados de grupos organizados, impulsionadas pelo avanço do agronegócio.

“Mesmo com a queda nos assassinatos, ainda não há o que comemorar. Os números de conflitos seguem alarmantes, e a violência contra os povos indígenas continua legitimada por uma estrutura que os criminaliza. A atuação do grupo ‘Invasão Zero’ é símbolo dessa escalada, que começou o ano de 2024 com o assassinato cruel de Nega Pataxó e se mantém no Congresso com projetos que atacam diretamente os direitos de quem vive e trabalha na terra”, afirma Maria Petronila Neto, coordenadora nacional da CPT.

O que mostram os dados

Os conflitos por terra foram os mais frequentes, representando 78% do total. Foram 1.768 casos, praticamente repetindo o pico da década de 1.766 em 2023. O Maranhão lidera o ranking com 363 ocorrências, seguido por Pará (234), Bahia (135) e Rondônia (119). Os principais alvos das violências foram quilombolas (29%), indígenas (25%) e posseiros (13%).

"Imagem aérea de uma vasta área queimada no campo, com o solo escurecido pelas cinzas e poucos trechos de vegetação preservada. Segundo a CPT, 2024 teve ápice de crimes contra indígenas, incluindo destruição de territórios, especialmente em Mato Grosso do Sul.
Área incendiada dentro do Quilombo dos Kalunga, o maior território quilombola do país.

Outras formas de violência cresceram. A destruição de casas chegou a 92 casos; os roçados foram destruídos em 72 situações; e as ameaças de expulsão subiram 150% — de 98 casos em 2023 para 245 no último ano.

A violência também avançou sobre os recursos hídricos. Os conflitos por água somaram 266 casos — aumento de 16% em relação ao ano anterior — sendo 71% relacionados a uso e preservação, e 23% a barragens e açudes. O Pará liderou os registros (65), seguido do Maranhão (45). As principais vítimas foram indígenas (27%) e quilombolas (22%). Os principais responsáveis pelas violações foram empresários (24%), fazendeiros (22%) e o governo federal (14%).

A atuação do Invasão Zero chamou a atenção. Em 2024, a CPT identificou ataques desse grupo nos estados de Goiás, Maranhão, Bahia, Espírito Santo, Paraná, Pará e Pernambuco. Em Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Ceará e Santa Catarina também ocorreram ataques coordenados de grupos de fazendeiros, porém sem confirmação de vínculo ao grupo organizado.

Meio ambiente e trabalho escravo

Os casos de contaminação por agrotóxicos explodiram: 276 ocorrências, um aumento de 762% em relação a 2023 (32 registros). Desse total, 228 casos foram no Maranhão, onde a pulverização aérea tem atingido diretamente comunidades tradicionais.

Avião despeja agrotóxicos em plantação de soja em fazenda na região rural de Bom Jesus, Piaui.

Os casos de incêndios em áreas rurais dispararam, com um aumento de 113% em relação ao ano anterior — saltaram de 91 para 194 ocorrências. Mato Grosso foi palco de um em cada quatro ocorrências no país. Já os registros de desmatamento ilegal cresceram 39%, passando de 150 para 209 – um em cada cinco deles no Pará.

No eixo trabalhista, foram registrados 151 ocorrências de flagrante de trabalho análogo à escravidão, com 1.622 trabalhadores resgatados — redução de 40% nos casos e de 39% nos resgates em comparação com 2023. A maior parte das vítimas estava nas regiões Sudeste (938), principalmente nas lavouras de café e cebola, e Centro-Oeste (234), na pecuária e cana.

Edição:
José Cícero / Agência Pública
José Cícero / Agência Pública

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