O Memorial JK é um dos atrativos turísticos mais visitados de Brasília. Lá, o visitante pode conhecer mais sobre a vida e história política do ex-presidente Juscelino Kubitschek, “o fundador” da Capital Federal, visitar a biblioteca dele, e ver suas roupas, bem como o local onde se encontram seus restos mortais. No final da visita, o visitante também podia comprar um cartão postal na lojinha oficial. Um deles com slogan semelhante a uma frase de Jair Bolsonaro (PL) que se tornou conhecida nos últimos anos da política nacional: “O Brasil acima de todos, Deus acima de tudo”.
O postal era vendido na lojinha ao preço de R$ 2 e apresentava uma foto da fachada do Memorial, com foco na estátua do casal Juscelino e Sarah Kubitschek, sentados em um banco na entrada. No verso está o slogan das campanhas bolsonaristas de 2018 e 2022, com uma pequena alteração. Na frase do ex-presidente, o Brasil está acima de tudo, e Deus, de todos. As palavras tudo e todos foram trocadas de lugar na frase impressa no postal. O verso do cartão ainda apresenta o nome do memorial, um espaço para adicionar endereço e o mapa do Brasil.
Depois do questionamento da Agência Pública, o souvenir foi retirado da lojinha, de acordo com funcionária da área cultural do Memorial. “A proprietária avisou e o postal foi retirado”, disse. Por telefone, ela ressaltou que “a lojinha é terceirizada”.
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Em entrevista, Maria de Fatima da Silva Azevedo, responsável pela loja, disse que o postal “é coisa antiga, não tem nada a ver com política, não, nem pode ter isso aqui”. Questionada sobre a data em que a venda do postal teria começado, ela primeiro disse que “acho que deve ser de 2020, por aí”, após a primeira eleição de Jair Bolsonaro, quando o slogan já era conhecido. Depois, questionada novamente, disse que havia uma “imprecisão” e que não lembrava quando o postal chegou à loja. Fátima é a única responsável pela loja, registrada para “comércio varejista de suvenires, bijuterias e artesanatos” com nome fantasia “Souvenir JK” em 2006.
“Eu compro a mercadoria e vendo, mas não sei quando que o fornecedor fez. Eles aparecem oferecendo, mas a gente não pergunta quando é que fez, onde é que fez, nada disso. Se interessa, se é motivo Brasília, a gente compra pra vender”, acrescentou. Ela também disse que, após ser contatada pela Pública, teria conversado com a fornecedora, que teria dito que a frase seria, na verdade, “evangélica”. Depois, Fátima se corrigiu e disse que a justificativa veio de uma “pessoa que conhece ela [a fornecedora]”.
“Aqui a gente não mexe com política, é proibido esse negócio de política aqui dentro, não tem partido. Cada um que quiser [ter] seu candidato, seu partido, tem que ser fora do Memorial”, acrescentou Fátima. Ela disse que antes do contato da reportagem “ninguém tinha atinado para isso, ninguém tinha prestado atenção nisso” e que retirou o postal da venda “para não ter problema”.
A reportagem também perguntou quem era a fornecedora, e Fátima disse ser uma autônoma, não uma empresa que produzia os postais, mas não passou detalhes. Também afirmou que esse postal em específico não precisou passar pela aprovação do Memorial JK para ser vendido, já que ele não apresenta logomarca oficial.
O Memorial JK é uma associação privada presidida por Anna Christina Kubitschek, neta do ex-presidente. O monumento para resgatar a memória de JK foi inaugurado em setembro de 1981, cinco anos após a morte do “fundador” de Brasília. O Memorial não respondeu às perguntas enviadas pela reportagem.