Mãe, quero ti pedir desculpa.
[…]
Quando eu sai vai ser só alegria. Vamos fazer tudo oque não pude fazer enquanto tô preso. Mãe, cinto sua falta cinto falta de sua comida cinto falta do seu abraço. Cinto falta de ti ver, mãe. Eu te pesso mas uma chance por favor. Não desista de mim ti prometo que eu vo mudar… Te amo mãe.
A carta de Ryan Pereira Bento foi a última que ele, aos 15 anos, escreveu à mãe, Márcia Roberta Pereira. O sonho de voltar à sua casa em Petrópolis, na serra fluminense, e ao convívio com a família foi frustrado após um incêndio em um alojamento de uma unidade de internação do Departamento Geral de Ações Socioeducativas (Degase), em 5 de agosto. Fundado em 1993, no governo de Leonel Brizola, o Degase aplica medidas judiciais em nível estadual aos adolescentes em conflito com a lei. Tem de fazê-lo de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), ou seja, visando ao acolhimento e à ressocialização. Para a Defensoria Pública do Rio de Janeiro, não foi isso que ocorreu com Ryan.
Foi na Escola João Luiz Alves, na Ilha do Governador, na zona norte do Rio de Janeiro, que ele e mais oito internos tentaram conter as chamas naquela manhã. No dia seguinte, em um hospital do Centro do Rio, Ryan não resistiu às queimaduras. Outro adolescente faleceu meses depois em uma unidade hospitalar da zona oeste: em 2 de outubro, Isaías Feittosa, de 16 anos, perdeu a vida em um centro de tratamento para queimados.
Os nove internos feridos no incêndio foram para unidades da rede pública de saúde. Todos foram algemados na cama durante o tratamento. Assim determinava uma decisão da Vara de Execução de Medidas Socioeducativas da Capital. Houve apelos do Ministério Público Estadual e da Defensoria Pública do Rio sob o argumento de que, feridos e traumatizados, os meninos não tinham como fugir. Em vão. Ryan e Isaías morreram em unidades hospitalares. Nos demais casos, o procedimento foi mantido até os meninos serem encaminhados para cumprir as medidas judiciais em casa. Um deles foi assassinado na noite de 25 de novembro, quando estava fora de casa.
O Degase tem dotação orçamentária própria – foram mais de R$ 200 milhões para 2016. Sua estrutura conta com oito unidades de internação em regime fechado, nas quais o adolescente fica proibido de sair; e mais 17 em regime semiaberto. No regime fechado estão atualmente 2.060 jovens, segundo a assessoria de imprensa do Degase. Mas as oito unidades têm estrutura para receber 979 adolescentes, ou seja, funcionam com mais que o dobro da capacidade. Na unidade João Luiz Alves, onde houve o incêndio, no último dia 1o de dezembro havia 320 menores de idade, mas a capacidade é para 112 pessoas, segundo a Defensoria Pública do Rio de Janeiro. Do mesmo modo, o Centro de Socioeducação Dom Bosco tem 216 vagas e 356 adolescentes; e o Educandário Santo Expedito, 180 vagas e 480 internos. Em fevereiro deste ano, o Tribunal de Justiça do Rio promulgou uma sentença proibindo unidades superlotadas e estipulando uma multa diária de R$ 200 mil por unidade em caso de descumprimento. O governo do estado recorreu, e o processo até hoje não foi a julgamento.
O incêndio
A Pública entrevistou um dos adolescentes que sobreviveram ao incêndio e um agente do Degase que estava de plantão naquela fatídica sexta-feira. A entrevista do menino foi autorizada pela mãe, desde que a reportagem não o identificasse. Ele está cumprindo sua pena em casa para se tratar dos danos físicos provocados pelo incêndio. A mãe reclama que o governo do estado pouco fez pelos jovens.
O rapaz contou que naquele dia nove internos se amontoavam em um alojamento onde cabem somente quatro camas. “Estávamos tentando ligar a tevê quando aconteceu um estouro. A fiação de uma extensão pegou fogo e atingiu um colchão. Ryan era o mais apavorado com o fogo. Chegou a jogar água da pia nas chamas, mas o socorro demorou a chegar.” O que passava na tevê, naquela ocasião, era um só tema: o dia da abertura dos Jogos Olímpicos de 2016 no Rio de Janeiro.
O adolescente conta que na unidade eles ficam a maior parte do tempo encarcerados nos alojamentos, que têm porta de ferro. “Mesmo na hora de comer, ficamos presos. A quentinha é passada por debaixo da porta. Quando alguém tem um problema de saúde ou queremos sair um pouco dali, a gente bica a porta. Na maioria das vezes, os agentes vêm já jogando spray de pimenta.” Em 2008, o então governador Sérgio Cabral (PMDB) obteve na Justiça uma liminar que permitiu a agentes do Degase usar armas não letais nas unidades. “Eles sempre usam essas armas e costumam dar madeiradas na nossa canela”, completou o jovem.
“Naquele incêndio havia nove menores no alojamento. Nele só cabem quatro camas, ou seja, quatro pessoas. Eles dormem um em cima do outro”, descreve um agente do Degase que pediu anonimato. “No dia do incêndio, quatro estavam fora do quarto porque desceram para a atividade do dia, o futebol. Há muita fiação solta ali, e de repente as chamas surgiram e não tivemos condição de contê-las. Suja e empoeirada, a mangueira d’água estava furada, não tínhamos nenhum tipo de equipamento nem treinamento para enfrentar uma situação dessas. Inalamos fumaça; eu fiquei com o braço e o rosto queimados. Tudo muito precário. Só havia dois extintores. Os menores foram levados nos carros do Degase para os hospitais. Deveriam ser transportados em ambulâncias para serem tratados no trajeto. Tudo muito improvisado”, lembra. A Escola João Luiz Alves tem 39 alojamentos, e cada um abriga de 12 a 14 adolescentes. Seis já seria um número excessivo, segundo ele.
A Defensoria Pública, em seu relatório sobre o caso, pôs em questão a falta de um procedimento que os levasse aos hospitais de maneira rápida e em ambulâncias. Afinal, não foi a primeira vez.
Em 2001, houve duas mortes de adolescentes na mesma unidade. Motivo: incêndio. “Naquele ano, dois meninos faleceram no hospital. Não havia um procedimento-padrão para esses casos. E, em 1997, seis jovens faleceram no Instituto Dom Bosco, então denominado Padre Severino. A experiência trágica do Dom Bosco, na Ilha do Governador, não suscitou a criação de mecanismos de prevenção às chamas nem de procedimentos para uma chegada rápida a hospitais”, revela Sidney Teles, então diretor da unidade João Luiz Alves, em 2001. Em 2002, outro incêndio, dessa vez no Educandário Santo Expedito, em Bangu, na zona oeste, levou à morte mais um adolescente.
As mortes por incêndio se somam às associadas a torturas perpetradas por agentes de segurança, supostas brigas entre adolescentes e até por doenças não tratadas a contento. Sidney Teles contabiliza 11 mortes só em incêndios em unidades do Degase nos últimos 20 anos. “Quando se coloca um jovem para cumprir medidas socioeducativas em condições subumanas, elas estão fadadas ao fracasso e à tragédia”, acrescenta Teles, que hoje trabalha na Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj). A Defensoria Pública do Rio constatou mais sete mortes violentas nas dependências do Degase desde 2007, além das duas devido ao incêndio deste ano na Escola João Luiz Alves. Não há, contudo, estatísticas oficiais sobre os óbitos e sobre as violações sofridas no sistema que tem no nome a expressão “socioeducativa”.
“Pedi tanto ao juiz que me devolvesse meu filho”
A voz de Márcia, a mãe de Ryan, é de uma pessoa devastada, mas que encontra forças para falar do filho. Funcionária pública, morava com ele em um apartamento em Petrópolis, a 68 quilômetros da capital do Rio de Janeiro, e pagava colégio particular no qual o adolescente cursava o quinto ano. “Há quatro meses, ele foi para um baile funk no Rio de Janeiro e, na volta para casa, foi revistado pela polícia, que encontrou 40 gramas de cocaína.” A punição foi severa: seis meses de internação na Escola João Luiz Alves. “Estava lá há apenas três meses quando ocorreu essa desgraça”, prossegue.
A mãe sabia que o filho era dependente químico. “Cheguei a pagar tratamento em uma clínica. O que o Estado deu a meu filho, porém, foi uma unidade do Degase em que ele dizia que dormia no chão por falta de colchonete. Ele sempre me pedia: ‘Mãe, pede pra me trocar daqui’. Pedi tanto ao juiz que o Estado me devolvesse o meu filho, pedi pelo amor de Deus para tirar ele lá de dentro. Ryan gostava de funk, hip-hop e reggae. Soltava pipa, amava andar de skate, era cheio de vontade de viver, adorava encontrar os amigos e, vaidoso, sempre se cuidava, se vestia bem. Já tinha sido pego com drogas outras vezes, mas o Estado não ofereceu um tratamento a ele. Pelo contrário, devolveu meu filho morto.”
Maycon Santos, gerente de recursos humanos, era padrasto de Ryan. Conheceu-o quando ele já estava com 13 anos. “Ele foi diagnosticado também com problemas psiquiátricos. Do ponto de vista legal, poderia ser visto como traficante; do ponto de vista clínico, não. Ele era usado por traficantes como mula [pessoas que transportam droga] a fim de se manter perto da droga, devido à sua dependência química. Sua morte mostra a total falta de competência do Estado em lidar com o adolescente que comete uma infração. Ele não representava uma grave ameaça à sociedade.”
Ele prossegue: “Entregaram um filho morto pra gente. Mas quem morreu foi o próprio sistema. O Estatuto da Criança e do Adolescente não funcionou. O Degase não funcionou e o Estado só pagou o enterro. Não deu qualquer indenização até agora”. À Pública, ele contou que Márcia está deprimida e o irmão de Ryan, Guilherme, de 12 anos, precisa de tratamento psicológico.
Maycon e Márcia já tinham internado Ryan na Clínica Nova Jerusalém, em São José do Vale do Rio Preto, município limítrofe de Petrópolis. Também passou um tempo no Centro de Recursos Integrados de Atendimento ao Adolescente (Criaad), uma unidade do Degase em regime semiaberto.
Ryan era um garoto de classe média cuja família custeou com dificuldade um tratamento para o uso abusivo de drogas. Já a história de Isaías é similar à maioria dos adolescentes conduzidos às unidades do Degase.
A família veio da cidade de Batalha, em Alagoas, chegando ao Rio de Janeiro em 2011. Foi morar numa casa que pertence a uma igreja evangélica na Penha, zona norte do Rio. O pai de Isaías, José dos Santos, veio com a esposa, Analia Feittosa, e os quatro filhos para ser caseiro da própria igreja. No Nordeste, a família vivia de fazer comidas típicas, como canjica, arroz-doce, pamonha, milho cozido e tapioca. Como ficou alto o custo dos ingredientes, José resolveu aceitar a proposta de ser caseiro no Rio.
“Desde criança, ouço a minha mãe reclamando que faltava comida em casa. Ela ficava chateada por não ter uma carne, um ovo. Miojo era coisa de luxo. Disseram à gente que, no Rio, teria mais trabalho”, lembra Mirian Feittosa, de 19 anos, irmã de Isaías. O pai passou a trabalhar em uma fábrica de vidro em Acari, também na zona norte. No ano passado, a igreja informou que a família não poderia mais ficar no seu terreno. Alugaram uma casa – um cômodo com um banheiro – na favela Kelson’s, na Penha, por R$ 500 mensais.
“Meu filho nunca havia tido uma passagem pela polícia. Ele foi levado por policiais no dia 31 de maio, acusado de um assalto com outros amigos no BRT na Barra da Tijuca”, lembra a mãe. “Não tinha arma alguma. Ele estava de chinelo, sem camisa e só com uma bermuda. Na escola do Degase, era elogiado pelos professores e monitores. Tinha bom comportamento. Sonhava com a carreira militar e em conhecer a filha dele…”. Três meses antes de Isaías ser detido, sua namorada, uma adolescente de 16 anos, dera à luz Mirell Sofia. “Na cama do hospital, muito queimado, ofegante e todo enfaixado, ele chegou a me dizer que queria ver a filha dele, que me amava, amava o pai dele, todos os irmãos. Ele adorava filme, fazia amizade com todo mundo, jogava bola, bola de gude. Jogo de computador, ele amava também”, descreve.
Internações ilegais
Eufrásia Maria Souza das Virgens, coordenadora de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (Cdedica), órgão da Defensoria Pública, diz que o Degase não é somente cúmplice de tragédias anunciadas, mas age contra a lei. “Há uma inobservância da lei que prevê que os adolescentes têm direito a habitar alojamento em condições adequadas de higiene e salubridade [artigo 124 do ECA] e também da Lei 12.594/2012, que institui o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo e disciplina a execução das medidas socioeducativas, estabelecendo o direito a cumprir medida em [regime] meio aberto quando não houver vaga para internação, exceto nos casos de ato cometido com violência ou grave ameaça contra a pessoa.”
Ela acompanha os dois casos e considera que as internações de Ryan e Isaías em regime fechado violam o ECA. Ryan “deveria ser visto como um dependente químico, e não como um traficante”, diz. Deveria ter recebido tratamento. “E há uma questão nova: crianças e adolescentes envolvidos no tráfico de drogas constituem uma forma de trabalho a ser enquadrada na Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Vivem uma das piores formas de exploração, semelhante à de jovens em guerras civis ou envolvidos em luta armada.”
Também a internação de Isaías é ilegal aos olhos da coordenadora da Defensoria. “Ele estava com amigos e, no suposto assalto a pessoas do BRT, não estava armado. Estava de bermuda e sem camisa. Assim como Ryan, ele não participou de um delito que oferecesse algum grau de violência a uma vítima ou grave ameaça, situações em que a legislação exige que o adolescente fique em regime fechado. Somente nesses casos os adolescentes devem ficar detidos em unidades do Degase, superlotadas. Fora isso, se não ficar em regime aberto, o que existe é um descumprimento de lei”, enfatiza. A defensora diz que a unidade onde ocorreu o incêndio já tinha um histórico de violações, constatado até pela ONU. Um relatório do Subcomitê de Prevenção à Tortura da ONU publicado em 2012 (baixe aqui o PDF) traz um diagnóstico que soa, ainda, muito atual: “O tratamento dispensado aos adolescentes privados de liberdade no Rio de Janeiro viola o exercício da proteção integral e desconsidera o adolescente como pessoa em sua condição peculiar de desenvolvimento. Nesse sentido, percebe-se que este se assemelha, em diversos aspectos, àquele destinados aos adultos no sistema prisional. A lógica punitiva é o fio condutor da relação de tratamento e ofusca, sem sombra de dúvidas, a lógica da socioeducação.
A reiterada utilização de algemas em quaisquer deslocamentos externos dos adolescentes, o uso recorrente de spray de pimenta, armas de eletrochoque (Taser), a ritualização da ‘cabeça baixa e mãos para trás em fila indiana’, a identificação dos jovens por números e a obrigatoriedade do corte de cabelo que ocorre em algumas unidades remetem a uma lógica militarizada, disciplinadora e punitiva que fere a inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral”.
Histórico de mortes, tortura e impunidade
A defensora Eufrásia põe o sistema em xeque com dados. Segundo ela, de 2008 até os dias de hoje, foram nove internos mortos nas dependências do Degase, a despeito de esses jovens estarem sob os cuidados do Estado. Ela esquadrinhou algumas violações de direitos no Degase e forneceu seu estudo com exclusividade à Pública.
Em 2008, relata, houve duas mortes: a de Andreu Luiz Silva de Carvalho, então com 17 anos, no Centro de Triagem e Reabilitação, na Ilha do Governador, que teria sido espancado por agentes; e de Cristiano de Souza, no Educandário Santo Expedito, em Bangu, também com 17 anos, vítima de violência institucional. “Meu filho foi encontrado com perfurações no corpo e o pescoço quebrado. Até hoje não há uma sentença do Tribunal de Justiça. Consegui um laudo de um legista independente, e ele constatou sinais de tortura no corpo do meu filho. Adolescentes testemunham, em juízo, que seis agentes do Degase torturaram o Andreu, com cabos de vassoura e barras de ferro. Já se passaram oito anos e até agora não houve qualquer sentença”, disse a mãe, Deise de Carvalho, à Pública. Ela está processando o governo estadual, por omissão, e os seis agentes. “Os seis agentes continuam trabalhando no Degase”, acrescenta sem esconder a revolta.
Em 6 de maio de 2013, no Centro de Socioeducação Antônio Carlos Gomes da Costa, na Ilha do Governador, foi constatada “a ocorrência de tortura contra uma menina, com o emprego de uma técnica denominada ‘bailarina’, que consiste em algemar as suas mãos apontadas para o céu, obrigando-a a permanecer na ponta dos pés para não sentir dores no braço”, segundo o levantamento da defensora. No mesmo ano, houve duas mortes de adolescentes. Renato da Silva Oliveira, de 17 anos, e Marcos Antônio dos Santos Tavares, de 14 anos, morreram na unidade de internação provisória Dom Bosco. Em 2015, houve um homicídio na Escola João Luiz Alves. Yuri Cassiano Rodrigues Ferreira, de 15 anos, estava na instituição havia apenas dois dias e teria sido morto por colegas de alojamento. No mesmo ano, mais uma morte de um adolescente na unidade de Volta Redonda. Nesse caso, a Defensoria Pública havia impetrado habeas corpus a fim de que o jovem saísse da internação para cumprir a pena em semiliberdade. No dia 2 de junho de 2015, mais um adolescente de 14 anos (Marcos Paulo de Mattos) foi vítima de homicídio na unidade João Luiz Alves. Todos esses casos têm em comum o fato de não terem sido esclarecidos, segundo Eufrásia.
Em 2016, Ryan e Isaías completaram essa macabra estatística. “Como, nesse contexto de morte e violência física, se pode falar em redução de maioridade penal?”, questiona Eufrásia.
Procurado pela Pública, o Degase alega que a superlotação é responsabilidade do Ministério Público e dos tribunais: “O Departamento Geral de Ações Socioeducativas do Estado do Rio de Janeiro esclarece que o número de apreensões de adolescentes que cometeram atos infracionais cresceu vertiginosamente nos últimos anos, resultando na superlotação, mesmo com a inauguração de novas unidades. Ressaltamos, porém, que o órgão apenas executa as medidas socioeducativas aplicadas pelo Poder Judiciário a esses jovens, como consta no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)”.
Em 2015, a Defensoria Pública propôs uma ação civil pública contra o governo do estado porque a Escola João Luiz Alves estava superlotada. A ação seguiu-se à ocorrência de dois estupros na unidade. A Defensoria tinha um objetivo central: que os menores apreendidos em atos criminais sem violência fossem remanejados a unidades semiabertas.
No dia 26 de fevereiro de 2016, a juíza Lúcia Glioche, da Vara de Execução de Medidas Socioeducativas da Capital, determinou que o estado do Rio limitasse o número de internos do Degase à lotação máxima permitida. Ela tinha em vista quatro das oito unidades em regime fechado: a Escola João Luiz Alves, com limite de 112 menores; o Educandário Santo Expedito, com capacidade para 210; o Centro de Socioeducação Dom Bosco, com capacidade de 216; e o Centro de Socioeducação Gelso de Carvalho Amaral, que comporta somente 64. As quatro operavam à época, respectivamente, com 268, 415, 416 e 242 internos. De lá para cá, na João Luiz Alves a superlotação apenas aumentou: foi de 268 para 330 internos. Como se viu, o Estado recorreu da sentença, e nada foi feito. Se a sentença valesse, mortes como a de Ryan e Isaías poderiam ter sido evitadas.