Enquanto vários jornalistas estavam discutindo como poderiam apoiar os sete colegas que tinham acabado de ser emboscados no México, no estado de Guerrero, por cem homens armados, que apontaram suas armas, ameaçaram queimá-los vivos e confiscaram seus equipamentos e seu veículo, recebemos a notícia de que Javier Valdez tinha sido assassinado.
O choro foi seguido pelo pânico. Javier era um dos mais famosos e internacionalmente premiados jornalistas mexicanos. Ele foi muito querido. Era como nosso irmão mais velho, que ensinou muitos de nós a cobrir o narcotráfico. Foi um generoso e responsável guia para todos os enviados nacionais e internacionais que vieram fazer investigações em Sinaloa, seu estado nativo e também a perigosa terra de El Chapo e seu cartel. Pensamos que ele era intocável, mas nos equivocamos. Sua morte traz uma mensagem de terror para o resto da guilda. Nesse mesmo dia, a vice-diretora de um jornal em Jalisco foi atacada; seu filho morreu.
Javier foi morto em maio. Em março, outros três jornalistas haviam sido assassinados, entre eles Miroslava Breach, correspondente em Chihuahua do jornal La Jornada, o mesmo diário nacional para o qual Javier trabalhava. Quando ficou sabendo da morte de sua companheira de trabalho, Javier postou um tuíte que ficaria famoso na hora de sua própria morte: “Que nos matem todos, se esta é a condenação de morte por reportar este inferno. Não ao silêncio”.
Em Sinaloa, o crime fez com que jornalistas conscientes dos riscos pedissem ajuda para que fossem retirados da região; agora, estão desabrigados. Enquanto nós, jornalistas mexicanos, exigíamos que as autoridades investigassem o crime de Javier, em Michoacán o jornalista Salvador Adame era colocado à força em uma caminhonete, por uma pessoa com o rosto coberto, e desde então encontra-se desaparecido. A notícia ficou invisível. As mobilizações dos jornalistas e os pedidos de justiça só funcionaram para Javier, o jornalista mais conhecido entre todos os assassinados desde 2006, quando o governo declarou a chamada “guerra ao narcotráfico” e desatou a violência.
Isto ocorre com frequência. Os assassinatos e sequestros de jornalistas no México são tão comuns que se tornaram costume, às vezes nem chegam a ser publicados.
Na semana seguinte soubemos que a orelha de Carlos Barrio, um jornalista de Quintana Roo, fora cortada e enviada como advertência a seu chefe. Quatro dias atrás foi baleada a indígena Marcela de Jesús Natalia quando saía da rádio onde trabalha. Outros casos de ameaças e censuras ocorreram, mas esses foram os mais graves dos últimos três meses.
O pedido dos jornalistas mexicanos, o mesmo há mais de 10 anos, é que o governo faça justiça. Mas, no México, a impunidade é uma política de Estado: 99,8% dos crimes contra jornalistas seguem sem punição. A impunidade é como uma pistola sem seguro, é um convite para que sigam silenciando os jornalistas, algo que está se convertendo praticamente em um esporte nacional.
No México há tantas agressões contra a imprensa que nós jornalistas saltamos de emergência em emergência. Não terminamos de atender uma crise quando temos outra já batendo à porta. Não conseguimos protestar pelo caso mais recentes quando já temos outro em cima.
“Estão no matando”, escreveu um grupo de jornalistas na Cidade do México na base do famoso monumento ao Anjo de Independência. “Estão nos matando” é o novo grito dos jornalistas mexicanos, que não estão exagerando: de acordo com dados oficiais, mais de 126 jornalistas foram assassinados desde o ano 2000, mais de 20 estão desaparecidos e ocorreram 51 atentados contra os meios de comunicação. Isso é um pedido de socorro para a comunidade internacional. Precisamos de ajuda.
*Marcela Turati é jornalista. Participante do programa Nieman Fellow 2017. Co-fundadora da associação “Periodistas de a Pie” e do Quinto Elemento Lab.