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Responsabilização de políticos que espalham desinformação e maior ação das plataformas são apontadas por pesquisadores como caminhos possíveis

Da Redação
20 de abril de 2022
12:00
Este artigo tem mais de 1 ano

“A desinformação não começa semanas antes das eleições. O combate à desinformação não pode ser feito de evento a evento.” Foi assim que Claire Wardle, co-fundadora e diretora executiva do First Draft, projeto dedicado a combater a desinformação, iniciou sua fala no evento “A batalha contra as fake news nas eleições brasileiras de 2022”, promovido pela Agência Pública em parceria com David Rockefeller Center for Latin American Studies, da Universidade de Harvard. 

A conversa, realizada na última quarta-feira, 13 abril, contou também com a presença de Pablo Ortellado, Coordenador do Grupo de Pesquisa em Políticas Públicas de Acesso à Informação (GPoPAI) da Universidade de São Paulo; David Nemer, Professor Associado do Berkman Klein Center da Universidade de Harvard e teve mediação de Natalia Viana, co-fundadora e diretora executiva da Agência Pública e Nieman Fellow na Universidade de Harvard e de Sidney Chalhoub, Professor de História e Estudos Africanos e Afro-Americanos na Universidade de Harvard.

E o que pode ser feito a respeito da desinformação nas eleições? Pablo Ortellado elenca quatro ações: a primeira é parar de financiar desinformação. “Quem está financiando isso é o Google através da monetização de sites e de vídeos no Youtube. O dinheiro vem do Google e da forma como ele funciona”, aponta. O segundo caminho é que as plataformas sejam mais duras com políticos que espalham desinformação. Para ele, o PL 2630/2020, chamado de “PL das Fake News”, poderia ajudar nisso, mas está fazendo o oposto, ao dar “passe livre” a políticos que disseminarem informações falsas. Nemer concorda: “Os políticos entenderam as plataformas como formas de capitalizar votos.”

Embora muitas pessoas e grupos que disseminam informação tenham passado a usar o Telegram, que recentemente se viu obrigado a atender exigências do STF para continuar funcionando no Brasil, o WhatsApp segue ativo como um vetor de notícias falsas. A terceira ação apontada por Ortellado seria implementar medidas para combater mensagens virais no aplicativo, sem interferir na comunicação privada de seus usuários. Como quarto ponto, ele aponta que as plataformas devem reforçar boas práticas contra ataques às eleições. Recentemente o Youtube mudou suas políticas e anunciou que começará a remover vídeos com alegações falsas de fraudes, erros ou problemas técnicos na eleição de 2018. “Mas o problema é esta eleição. Devemos encontrar boas políticas”, diz.

Para Claire Wardle, é necessário deixar claro para as pessoas que a desinformação é uma arma para a campanha política. “É preciso fazer uma conversa sobre como a comunidade pode se envolver e sobre quais são os riscos da desinformação. Ensinar quais táticas são usadas em campanhas de desinformação.” Ela reforça que as plataformas ainda não têm políticas prontas no ano eleitoral, nem no Brasil nem em outros 21 países que enfrentam eleições esse ano.    

Wardle apontou também que a desinformação e a desconfiança de norte-americanos como Donald Trump no processo eleitoral pode impactar outros países, como o Brasil. “O ecossistema da desinformação é dinâmico. As pessoas se sentem parte desse sistema. A invasão ao Capitólio foi de hashtag para ação.” E completou: “Os EUA são os maiores exportadores de uma das maiores narrativas de desinformação, sobre fraude eleitoral”.

Claire Wardle assinala, ainda, uma característica da desinformação que vence a batalha de audiências sobre o jornalismo: “Desinformação é um processo participativo. As pessoas sentem que fazem parte de uma comunidade e que são ouvidas. Essa é a razão porque a desinformação funciona. Elas não estão apenas passivamente recebendo desinformação”, diz ela. “O jornalismo, entretanto, ainda é feito de cima para baixo”.

Para David Nemer, é necessário tanto entender e desconstruir a estrutura humana da desinformação quanto compreender o papel de plataformas como Facebook e Twitter na disseminação. O pesquisador tem estudado as estruturas humanas por trás da desinformação. Ele explica que no topo da cadeia estão influenciadores que definem a agenda e escolhem quando notícias falsas serão espalhadas. “Bolsonaro precisa ter sempre um inimigo para manter as redes animadas e compartilhando desinformação”, comenta.

Sobre o que pode ser feito pelas plataformas, Nemer complementa: “Estudos mostram que a maneira mais eficaz é identificar e retirar das plataformas quem espalha desinformação. As plataformas podem fazer isso, têm dados internos para identificar.” Claire Wardle alerta para que as empresas tomem providências a tempo. “Não fizeram nada até 7 de janeiro [dia da invasão do Capitólio, nos Estados Unidos]. O Brasil precisa ter um grupo independente para cobrar essas ações agora, não um dia antes do golpe.”

As pesquisas de intenção de voto têm mostrado que a disputa entre Lula e Jair Bolsonaro para a Presidência será acirrada. Para David Nemer, quanto mais acirrada a disputa, há mais espaço para que as eleições sejam contestadas. Ele também comenta sobre o uso das redes pela direita e pela esquerda: “a esquerda segue as regras, ao contrário da direita. Por seguir as regras, já começa em desvantagem. O desafio é maior”. 

Em breve, a conversa será disponibilizada na íntegra no canal do David Rockefeller Center no Youtube.

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