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Em meio a impasse entre militares e PF pela segurança presidencial, uso de veículos do GSI virou um problema

Reportagem
27 de junho de 2023
17:26

Cabe somente ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tomar uma decisão até a próxima sexta-feira, 30 de junho: tornar a Secretaria Extraordinária de Segurança Imediata do Presidente da República (SESP) permanente ou devolver sua segurança pessoal para o GSI (Gabinete de Segurança Institucional).

Segundo a Agência Pública apurou, essa decisão será tomada em meio a uma disputa entre Polícia Federal e militares. Esse embate por protagonismo na segurança de Lula envolve a utilização de uma frota de carros blindados e equipamentos de segurança.

A SESP foi criada por decreto presidencial no dia 24 de janeiro, após os eventos golpistas do 8 de janeiro. Lula tinha desconfianças em relação aos militares e chegou a dizer publicamente que “muita gente” das Forças Armadas foi “conivente” com a invasão aos Três Poderes, o que reflete em sua segurança direta. 

Mas a disputa entre PF e o GSI se iniciou ainda na transição, quando a secretaria extraordinária foi desenhada pela equipe liderada pelo atual diretor-geral da PF, delegado Andrei Rodrigues.

Composta em sua maioria por policiais federais, a SESP é a atual responsável pela segurança imediata de Lula, aquela em que os agentes ficam ao seu lado, dedicando-se também à proteção dos seus familiares e seu vice, Geraldo Alckmin. Cabe à secretaria planejar, coordenar e executar a segurança do presidente e do vice. 

Ao perder as atribuições da segurança presidencial imediata, o GSI ficou responsável por outras duas camadas dos chamados “anéis de segurança”, a aproximada e a afastada, sobretudo em eventos, estabelecendo parâmetros de segurança em casos de emergência e fazendo a varredura do local onde está o chefe do executivo. 

Com o decreto que criou a SESP prestes a expirar, a secretaria chefiada por Alexsander Castro de Oliveira, delegado da PF que comandou a segurança de Lula durante a campanha eleitoral, tenta manter a corporação com as suas atuais funções. Entre os argumentos, está o fato de que governos democráticos teriam a segurança realizada por civis e não militares. 

Na imagem, o presidente Lula, um homem de meia idade branco de cabelos e barbas grisalhas acena para o povo ao lado de sua esposa, Janja uma mulher branca de cabelos e olhos castanhos. Lula e Janja participam de sua posse como presidente.
Já durante a posse, a Polícia Federal fez a segurança imediata de Lula e Janja

Em abril, um seminário liderado pela SESP para debater formas de segurança presidencial contou com representantes de países como Portugal, Argentina e Alemanha, que também possuem civis no comando da proteção de autoridades.

Fontes contaram à Pública que o GSI estaria dificultando acesso a equipamentos e materiais de segurança que seriam importantes no dia a dia dos agentes federais como, por exemplo, empréstimo de rádios transmissores e até automóveis blindados para proteção da comitiva presidencial. O GSI negou em resposta encaminhada à Pública

O órgão militar diz que foram realizadas “várias reuniões de coordenação, envolvendo representantes da Casa Civil, do GSI, do Gabinete Pessoal do Presidente da República e da SESP, para atendimento das necessidades apontadas pela SESP para cumprimento de suas atividades” e afirma ainda ter destinado “5 milhões de reais para apoiar a SESP, que constaram então de uma solicitação formal, tendo sido disponibilizados no dia 5 de junho de 2023, cuja transferência encontra-se em processamento pela Secretaria de Orçamento Federal (SOF)”. 

O imbróglio dos carros blindados da presidência

Dois pedidos de Lei de acesso à informação (LAI) foram realizados pela Pública para saber a destinação atual de uma frota de ao menos 30 veículos Ford Fusion Titanium AWD Ecoboost, 12 deles blindados. A frota foi adquirida em 2019 pelo GSI, na gestão Jair Bolsonaro, em licitação de R$5,8 milhões. 

Em geral, uma comitiva presidencial deve ser formada por, no mínimo, cinco veículos idênticos, a fim de dificultar a identificação de qual deles carrega o chefe do Executivo. Os modelos blindados do Ford Fusion têm capacidade de resistir a tiros de submetralhadora, de calibre 9 milímetros e são todos pretos.

As respostas das LAIs revelaram informações contraditórias sobre a destinação dos veículos. A resposta do GSI registra que todos os trinta carros Ford Fusion Titanium AWD Ecoboost, “estão destinados às missões de Segurança Presidencial”.

Mas a SESP contradiz o GSI, em informação também repassada via LAI. A Secretaria criada por Lula afirmou que apenas dois dos 30 Ford Fusion estão em uso nas atividades de segurança presidencial.

Segundo a SESP, a atual frota empregada nas atividades de segurança imediata é “composta por 5 (cinco) veículos”, sendo apenas “dois veículos blindados do modelo Ford Fusion”. Outros três veículos blindados da Ford pertencentes ao GSI, só que de modelo diferente (Ford Edge), também foram emprestados à SESP. O restante da frota da secretaria utiliza carros da própria Polícia Federal.

Sobre as viaturas adquiridas em 2019 via licitação, o GSI disse à Pública que o processo licitatório previa sua utilização na segurança presidencial, “o que efetivamente vem ocorrendo”, afirma. “Cabe lembrar que o Decreto no 4332, de 12 de agosto de 2002, estabelece o Sistema de Segurança Presidencial, com os círculos imediato, aproximado e afastado. Os anéis aproximado e afastado continuam sob responsabilidade do GSI, além da segurança dos Palácios e Residências Presidenciais, Sistema que emprega, diariamente, mais de 10 vezes a quantidade de pessoal que o anel imediato e traz a necessidade da manutenção, pelo GSI, dos meios necessários para cumprimento dessa missão. O GSI possui hoje 30 veículos destinados ao cumprimento de todas as missões de segurança presidencial atribuídas ao GSI pela Lei no 14.600, de 19 de junho de 2023″. 

Ainda segundo o GSI, outra solicitação envolveu o pedido de 43 viaturas, entre operacionais e administrativas. “As negociações a esse respeito finalizaram com o acordo de fornecimento de 33 viaturas, além de 5 viaturas obtidas por meio de comodato junto à empresa Ford do Brasil S/A. Essas eram as viaturas empregadas no comboio do Presidente da República, que foram disponibilizadas no dia 25 de janeiro de 2023.

“Para a cessão das demais viaturas, seguiu-se extensa negociação sobre responsabilidades civis, administrativas, criminais e orçamentárias decorrentes do uso dessas viaturas em atividades de risco, incluindo a sub-rogação dos contratos de comodato e de seguros. Quando essa negociação foi finalizada, já se estava há pouco mais de um mês do último dia previsto em decreto para a extinção da SESP, estando já essa Secretaria cumprindo suas missões com meios da própria Polícia Federal, por praticamente todo o período previsto. Chegou-se à conclusão que não seria mais oportuna a transferência patrimonial que, quando estivesse concluída, poderia ter que ser imediatamente revertida”, diz o órgão. 

A resposta do Gabinete de Segurança Institucional reforça o que fontes disseram à reportagem sobre a situação dos carros ser parte de uma disputa que se arrasta desde janeiro por espaço na segurança presidencial.

A SESP teria apoio do Ministério da Justiça, de Flávio Dino e da primeira-dama, Rosângela Silva, a Janja, para seguir na função de segurança imediata. Já o GSI, sob o comando do general Marcos Antonio Amaro dos Santos, tem o apoio da Casa Civil, de Rui Costa e do Ministério da Defesa, de José Múcio, para reassumir a função exercida em governos passados.

O próprio Rui Costa, no dia 20 de junho, disse que a segurança pessoal do presidente ficará sob comando do GSI assim que expirar o prazo da SESP na próxima sexta-feira. “É o GSI quem vai fazer e o presidente terá a liberdade de convidar quem ele entender que deve compor, independentemente de ser policial federal, policial militar ou membro das Forças Armadas. Será montado um modelo híbrido, mas sob coordenação do GSI”, disse o ministro da Casa Civil dias atrás. A situação, no entanto, ainda dependeria do aval de Lula, que pode postergar a decisão mesmo com o fim do decreto presidencial. 

Ricardo Stuckert

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