Com quatro dias de atraso, o governo federal colocou em marcha, na manhã desta segunda-feira (2), a operação de retirada dos invasores da Apyterewa, no sul do Pará, a terra indígena mais desmatada no país durante o governo de Jair Bolsonaro (2019-2022). A demora foi provocada por articulações políticas do governo do Pará que, segundo organizações indígenas e fontes consultadas pela Agência Pública, tentavam adiar a operação. Ela ocorre em um reduto bolsonarista governado por um prefeito do mesmo partido do governador do Pará, Helder Barbalho (MDB).
A operação mobiliza mais de 300 servidores de 14 órgãos públicos diferentes, incluindo Força Nacional, Funai e Polícia Federal. Nesta manhã, estão sendo distribuídas aos invasores cópias de um comunicado sobre a ordem de saída “imediata”. Há duas decisões judiciais pendentes de cumprimento, uma expedida pelo ministro do STF Luís Roberto Barroso e outra, pela Justiça Federal de primeira instância em Redenção (PA).
O comando da operação estima que 2 mil pessoas hoje ocupam ilegalmente a terra indígena. De acordo com o Censo de 2022, há 1.383 pessoas residentes na Apyterewa, das quais 767 são indígenas (55% do total). Nos últimos anos, de 60 a mil a 100 mil cabeças de gado foram espalhadas dentro do território indígena na tentativa de consumar o esbulho do território, de acordo com o governo.
Conforme a Pública revelou na semana passada, estava tudo pronto para o início da operação na quinta-feira (28), mas as equipes de servidores, metade das quais mobilizada em Marabá (PA), foram orientadas a paralisar os trabalhos até que houvesse uma decisão política em Brasília.
A operação é considerada sensível por ter como cenário uma região que já registrou diversos ataques a equipes de fiscalização do Ibama pelos invasores. O discurso propagado por lideranças políticas de que o território indígena poderia ser reduzido levou ao recrudescimento da invasão. Além disso, a ação envolve órgãos diversos dentro do governo. Por isso, a ação é articulada pela Secretaria Geral da Presidência da República, em Brasília, a exemplo do que ocorreu na desintrusão da Terra Indígena Alto Rio Guamá, no Maranhão, que ocorreu em maio sem confrontos nem feridos.
Governador silencia
A Pública confirmou junto à Casa Civil da Presidência que o governador Helder Barbalho esteve com o ministro da Casa Civil, Rui Costa, em Brasília no mesmo exato dia em que a operação deveria ter começado, na quinta-feira (28). A Casa Civil, contudo, se recusou a informar se Barbalho solicitou o adiamento da operação.
“Em reunião ocorrida no dia de ontem (28), o ministro Rui Costa e o governador Helder Barbalho conversaram sobre diversos assuntos, entre eles a organização da COP 30, em Belém. Sobre eventuais pedidos do governador, sugerimos que consulte sua assessoria de imprensa”, disse a assessoria.
A resposta da Casa Civil só foi enviada 48 horas depois do primeiro pedido de informações encaminhado ao órgão pela Pública na quarta-feira (27). A audiência concedida por Costa a Barbalho ocorreu na quinta-feira (28). Ao retardar a resposta à reportagem, a Casa Civil evitou explicar que Barbalho estaria no prédio no dia seguinte. A agenda diária de compromissos não é publicada no mesmo dia dos eventos, apenas dias depois. A Casa Civil diz que, ao agir assim, cumpre a legislação.
A Pública também procura o governo do Pará desde a semana passada. Não houve qualquer resposta aos questionamentos. Barbalho tem se apresentado como um grande defensor da floresta amazônica porque o Brasil conseguiu, por meio de articulação política do governo Lula, atribuir a Belém (PA) a sede da conferência da ONU sobre a emergência climática prevista para novembro de 2025.