“[A reforma da Previdência] vai fazer com que os trabalhadores mais pobres deste país, sobretudo os trabalhadores rurais deste Nordeste, passem a receber metade de um salário mínimo sem ter noção do que esses trabalhadores representam na economia da pequena cidade desse país.” – Luiz Inácio Lula da Silva, ex-presidente da República, em discurso no dia 15 de março.
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) discursou contra a reforma da Previdência, durante ato em São Paulo, no dia 15 de março. Na ocasião, disse que a proposta do governo federal “vai fazer com que os trabalhadores mais pobres deste país, sobretudo os trabalhadores rurais deste Nordeste, passem a receber metade de um salário mínimo sem ter noção do que esses trabalhadores representam na economia da pequena cidade desse país”.
Será verdade que os trabalhadores mais pobres, especialmente os do campo, passarão a receber metade de um salário mínimo, caso seja aprovada a reforma da Previdência proposta por Michel Temer (PMDB)? O Truco – projeto de checagem da Agência Pública – resolveu conferir se a fala procede ou não.
Seguindo a nossa metodologia, perguntamos as fontes utilizadas pelo ex-presidente. De acordo com a assessoria do Instituto Lula, ele se baseou no próprio texto da reforma, “que altera o tempo de contribuição e idade mínimas e as regras do Benefício de Prestação Continuada”, diz a resposta enviada.
Recorremos, então, ao texto da reforma, dividindo a checagem em três partes. É verdade que alguém vai se aposentar recebendo metade de um salário mínimo? Além da aposentadoria, algum benefício previdenciário poderá pagar somente a metade do salário mínimo? O que muda para os trabalhadores rurais?
A primeira resposta é não, e inclui os trabalhadores urbanos e rurais, do Nordeste ou de qualquer outra região brasileira. Como anunciou o governo no dia em que apresentou a reforma ao Congresso Nacional, o piso previdenciário continuará vinculado ao mínimo. Ou seja, quando o salário mínimo aumentar, o valor da menor aposentadoria aumentará junto, de forma a se manter a equivalência entre os dois. O texto encaminhado aos parlamentares não apresenta modificações nesta vinculação.
Como a assessoria do ex-presidente mencionou um benefício previdenciário, além da aposentadoria, também checamos se algum benefício poderá pagar metade do salário mínimo. Aqui, a resposta é sim. A nova fórmula de cálculo das pensões por morte permitirá ao governo pagar aos pensionistas apenas 50% do valor da aposentadoria, com acréscimo de 10% para cada dependente. A regra vale, inclusive, para o benefício deixado por mortos que recebiam um salário mínimo de aposentadoria. Neste caso, a pensão por morte poderá, portanto, ser de apenas metade do mínimo, se não houver dependentes na família.
O Benefício da Prestação Continuada da Lei Orgânica da Assistência Social (BPC/LOAS) também poderá ser inferior ao salário mínimo, já que a indexação deixa de acontecer, assim como nas pensões por morte. Não há nenhum indicativo, entretanto, de que o valor poderá, de imediato ou no futuro, equivaler à metade do salário mínimo, embora isto seja legalmente possível em caso de aprovação da reforma como pretendida pelo governo federal.
Também checamos as alterações previstas para os trabalhadores rurais, que são radicais, mas não incluem a redução do valor pago de aposentadoria a eles, como sustentou Lula. A polêmica equiparação das exigências para os contribuintes do campo e da cidade está entre os pontos previstos na reforma. A idade mínima para a aposentadoria no meio rural será elevada para 65 anos – atualmente, ela é de 60 anos para os homens e de 55 anos para as mulheres – e os agricultores terão de contribuir por 25 anos para requererem o benefício. Atualmente, eles podem se aposentar mesmo se nunca tiverem contribuído.
A análise da declaração mostra que o ex-presidente Lula errou ao dizer que a reforma da Previdência permitirá o pagamento de metade de um salário mínimo aos aposentados mais pobres do país. A situação não se aplica aos trabalhadores do campo, nem da cidade. Somente as novas concessões de pensão por morte, após a reforma, poderão pagar 50% do mínimo – ainda assim, somente, em alguns casos. O Benefício de Prestação Continuada (BPC) deixa de ser vinculado ao piso previdenciário, mas não há nenhum dado ou proposta de que poderá equivaler à metade dele. O Truco conclui que a afirmação é falsa.