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Reportagem

Hidrelétrica brasileira na Guiana serviria de apoio em disputa com a Venezuela

Segundo embaixador brasileiro, infraestrutura em território fronteiriço iria consolidar a reivindicação da Guiana sobre a área

Reportagem
27 de junho de 2011
16:00
Este artigo tem mais de 12 ano

Em 5 de outubro de 2009, o embaixador Rubem Barbosa, consultor do ministro de Minas e Energia Edison Lobão, reuniu-se com o assessor econômico da embaixada dos EUA em Brasília para explicar os planos do Brasil construir uma usina hidrelétrica com capacidade de 800 megawatts na região do Alto Mazaruni, fronteira entre a Venezuela e a Guiana.

A ideia para a construção teria sido do presidente da Guiana, Bharrat Jagdeo, durante um encontro com Lula em 14 de setembro de 2009 para inaugurar uma ponte binacional.

Duas semanas depois, Lula enviou uma delegação chefiada por Lobão e pelo o presidente da Eletrobrás, José Antônio Muniz Lopes, acompanhada por Barbosa, que incluía representantes do BNDES e da construtora Andrade Gutierrez, uma das empreiteiras que seriam responsáveis pela obra.

“Enquanto saciar as necessidades de suprimento de energia para os dois países seria a razão principal para esse projeto, Barbosa confidenciou que as razões políticas para a obra também são fortes”, diz um telegrama diplomático obtido pelo WikiLeaks.

“Dado que a planta hidrelétrica seria construída em uma parte do território da Guiana que está em disputa com a Venezuela, Jagdeo vê como um esforço importante para consolidar a reivindicação da Guiana sobre a área”, diz Barbosa.

O investimento seria de 2 bilhões de reais para a construção da usina hidrelétrica do Alto Mazaruni e de uma linha de transmissão de 580km, que levaria ¾ da energia para Roraima. Gianfranco Micelli, da Andrade Gutierrez, chegou a anunciar que a obra estaria concluída em 2015.

Perguntado pelo representante americano se a construção não seria incômoda para o Brasil, Barbosa disse que o venezuelano Hugo Chávez não havia se envolvido pessoalmente na disputa de território, o que teria deixado ex-presidente Lula “confortável” em apoiar a obra.

Barbosa disse ainda que Lula queria ver a Guiana e o Suriname na União de Nações Sul-Americanas (UNASUL) e via o investimento como uma oportunidade nesse sentido.

Segundo a assessoria de imprensa da Eletrobrás, a empresa está realizando o estudo de pré-viabilidade da hidrelétrica, que pode levar cerca de dois anos para ser concluído.

A Eletrobrás também está fazendo um inventário do potencial hidrelétrico do país, a partir de um memorando de entendimento assinado com a Guiana em 2009.

Disputa histórica

O território fronteiriço do Alto Mazaruni, na região de Essequibo, tem sido alvo de disputas entre a Guiana e a Venezuela desde a década de 60.

Os planos guianos para construir a hidrelétrica, a partir de meados de 1975, foram por água abaixo quando, em 1981, o governo da Venezuela rejeitou o projeto por causa da sua demanda pelo território – rico em urânio, ouro e diamantes. Além disso, protestos de comunidades indígenas ajudaram a engavetar o plano.

Em novembro de 2007, o governo de Bharrat Jagdeo acusou a Venezuela de violar seu território, com a incursão de 40 soldados venezuelanos nas águas disputadas.

No ano passado, um relatório da Survival International colocou a futura hidrelétrica como uma ameaça às tribos indígenas Akawaios e Arekunas. Segundo a organização, com a inundação de parte do território, milhares de indígenas perderiam suas terras, tornando-se refugiados.

Os documentos são parte de 2.500 relatórios diplomáticos referentes ao Brasil ainda inéditos, que foram analisados por 15 jornalistas independentes e estão sendo publicados nesta semana pela Agência Pública.

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