“Chega de Fiu-Fiu”, #MeToo, #TimesUp, “#MeuPrimeiroAssédio”, #MeuAmigoSecreto são campanhas que partiram de movimentos que colocaram o assédio sexual em pauta nas redes sociais. Como resultado, milhares de relatos vieram à tona para denunciar abusos que têm como pano de fundo o machismo. Recentemente, outra campanha foi lançada “Deixa ela trabalhar”, que reúne jornalistas mulheres contra o assédio.
Para falar sobre esses temas, a Agência Pública reuniu na Casa Pública, no Rio de Janeiro, a jornalista Mariliz Pereira Jorge, colunista na Folha de S.Paulo, Bruna Rangel do coletivo Não Me Kahlo e Nilcea Freire, ex-ministra da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres. A entrevista foi conduzida por Giuliana Bianconi, co-fundadora da Gênero e Número.
Giulliana Bianconi – Quando a gente fala em feminismo em rede, logo se associa isso a redes sociais. Qual é a diferença fundamental entre essa rede de antes e essa rede atual que massificou o debate?
Nilcea Freire – Nós, que somos mais velhas, temos que ter um olhar que possa compreender e colaborar com as feministas de hoje. Se, por um lado, as feministas de hoje têm modos de ação e de organização diferenciadas das que nós tínhamos na época em que começamos a nossa militância feminista, por outro lado, nós sentimos que falta informação às jovens feministas sobre esta caminhada e também sobre conceitos e questões que embasaram as lutas de ontem e que seguem sendo importantes hoje.
Não basta a gente pintar a cara e sair para a rua e achar que a gente vai mudar o mundo. Essa é uma conclusão a que, depois de muitas passeatas, eu cheguei: de que ir para a rua é absolutamente fundamental. Agora, de que rua nós estamos falando? A rua é aqui, a rua é nas redes sociais, a rua é a rua mesmo? Enfim, em qualquer lugar você pode exercer a sua cidadania, neste seu lugar de feminista, reivindicando lugar de fala na rua. Esse conceito de rua ampliado é que pode nos ajudar a transformar a situação que temos hoje, onde se tem muita informação, pouca sistematização e pouco aprofundamento.
Bruna Rangel – Houve uma grande transformação em termos da massificação desse conteúdo, e as redes tornaram isso possível. Primeiro, porque o feminismo, às vezes, ficava muito restrito a campos específicos, principalmente a universidade. Hoje em dia, a gente tem ainda uma grande dificuldade de falar de gênero, inclusive nas escolas.
Normalmente, o primeiro contato que os jovens têm com o feminismo é por meio da internet. Acredito também que um aspecto positivo dessa pulverização do poder da informação com a internet é que, por exemplo, talvez um grande veículo de mídia não falasse sobre a questão do aborto. Mas há várias páginas e várias organizações falando e criando um conteúdo também captado por esses veículos de comunicação.
Foi o caso de várias hashtags: do #meuamigosecreto, do #porquesoufeminista. Talvez não fossem pautas desses veículos de comunicação, mas eles estão de olho nas redes sociais, e isso acaba sendo pautado.
Agora, o que a gente percebeu trabalhando no Não Me Kahlo esse tempo todo é que existem vários tipos de conteúdos diferentes e várias formas de abordar determinado assunto. Uma pessoa que está nas redes sociais, por exemplo, pode não parar para ler um artigo de 20 páginas. Mas pararia para ver um vídeo ou leria um texto menor.
Isso não tira a possibilidade de a pessoa poder se aprofundar em determinado assunto. É só uma forma diferente de se comunicar. A gente vê pelos dados de acesso que quem lê, por exemplo, o texto “10 formas de combater o machismo” também lê o conteúdo “O que é violência simbólica?”, mais denso e aprofundado sobre o tema. A gente não pode desprezar um conteúdo porque ele pode parecer superficial.
Mariliz Pereira Jorge – Demos um grande passo quando o feminismo voltou às nossas pautas. Hoje, ele está presente diariamente nas redes sociais, está diariamente presente na grande mídia e nos sites que são especializados. E claro que várias vozes se ergueram. Muitas pessoas começaram a falar, e cada pessoa acredita ou passa para a frente o feminismo como ela enxerga, como o vive. Acho que todas as mulheres são feministas, embora algumas digam que não são ou não se enxerguem feministas, talvez porque não entendam exatamente o que o feminismo de fato significa. Acho que o nosso papel é trazer esse entendimento para que a gente ganhe massa, espaço, voz e consiga dar passos maiores.
O que percebi nesses anos em que a gente voltou a caminhar: uma briga entre feministas. Umas querendo ser mais certas ou mais representantes do feminismo e de todas as mulheres do que as outras. Isso é muito ruim para o movimento.
A gente fala também de sororidade, de que tem que se abraçar, mas não acontece na prática. O movimento só perde porque as grandes vozes e forças que se contrapõem ao feminismo é que ganham força contra as coisas em comum que todas as feministas têm, que é lutar por igualdade, por mais representatividade, lutar contra a violência contra a mulher.
Vou dar um exemplo. Há três anos escrevi um artigo na Folha de S.Paulo falando que o feminismo precisava dos homens, que a gente não faz revolução, a gente não muda o mundo sozinha, a gente precisa que esse interlocutor entenda a mensagem que nós, mulheres, estamos passando e abrace esse movimento, abrace as nossas causas junto com a gente.
Fui achincalhada por algumas vertentes do feminismo mais radicais. Vejo pontos positivos nesse radicalismo porque acho que, em alguns momentos da história, se precisa de radicalismo para promover mudanças. Eu respeito o que é feito, mas também quero ser respeitada.
Acho que a gente tem, sim, muitas conquistas a serem feitas. Acho que a gente tem várias vertentes, mas o que o feminismo hoje em dia está precisando é respeitar essas diferenças que existem dentro do movimento.
Nilcea Freire – Queria fazer uma colocação sobre essa questão do feminismo ou dos feminismos, e é importante que a gente pluralize. A gente não pode esquecer que, a partir de um certo momento, e vou tratar de 2013, há uma apropriação da questão do feminismo, da palavra “feminismo”, de alguns signos do feminismo até mercadológica. Então, é importante que a gente tenha também essa clareza. É muito oportunista. A diversidade, entre nós, entre as feministas, não pode ser motivo de uma apropriação mercadológica ou apropriação para finalidades que não sejam as nossas.
Giulliana Bianconi – Acho que falta mesmo acolhimento, concordo nesse aspecto. Acho que foi um aprendizado, inclusive para as feministas históricas, essa chegada dessa geração que vem fazendo de uma forma muito mais orgânica, sem tanta conceituação, sem tanto embasamento teórico. Teve um estranhamento quando surgiu a campanha “Chega de Fiu-Fiu”, #MeuPrimeiroAssédio, havia uma negação. E depois essas mulheres, nós também, fomos acolhidas. Eu mesma sinto isso na Gênero e Número: a gente hoje é validada pelo movimento de mulheres. Mas no início era assim: “Mas elas são jornalistas, elas são feministas, o que elas são? Será que elas estão contribuindo de alguma forma com o que a gente está falando e fazendo?”.
Mariana Simões – Temos uma pergunta das redes do Caio Rearte: “O #MeToo partiu de Hollywood. A Rose McGowan, que foi uma das atrizes que começou o movimento, foi atacada várias vezes. Existe uma defesa sistemática, de cima pra baixo, desse sistema de abuso? E o que o fato de muitos queridinhos do cinema serem abusivos nos diz sobre Hollywood?
Bruna Rangel – Uma coisa que li recentemente, que eu não vou saber dar mais informações, é que o #MeToo não nasceu em Hollywood. Já era utilizado bem antes. O que Hollywood fez foi o Time’s Up, e o #MeToo foi meio que apropriado também para se falar sobre assédio.
Mariliz Pereira Jorge – O que esse número de casos de assédio nos diz sobre Hollywood? Na verdade, joga luz num problema que acontece em todos os segmentos e setores. A gente viu todas essas atrizes contando o que aconteceu com elas, mas, se eu for na minha área de trabalho, que é o jornalismo, isso certamente já aconteceu com todas as minhas colegas dentro de redações ou quando saem a campo para trabalhar. Isso já aconteceu comigo, mas com entrevistados. O que está acontecendo é um microcosmo do que acontece no cotidiano de todas as pessoas, onde quer que você trabalhe.
Nilcea Freire – Eu queria contar um caso que ilustra porque o trabalho e a questão do assédio estão no mesmo diapasão da violência. Quer dizer, é uma vertente da violência de gênero. Pela minha escuta como professora na universidade, quando fui eleita reitora, resolvi criar uma ouvidoria universitária. Foi como se nós tivéssemos destampado a tampa de uma fossa. Eram denúncias e mais denúncias de abuso e de assédio de professores com professoras, de professores com estudantes, e uma que teve que chegar ao meu gabinete porque o perpetrador da violência, de alguma maneira, tinha que ser punido. Era de dentro do consultório médico da policlínica da universidade. Acho que isso também acontece com cada uma dessas campanhas, com cada uma dessas iniciativas. É como destampar um ralo e daí começam a sair as vozes que estavam sumidas pela opressão machista.
Vanderlei Vazelesk – Queria que vocês falassem um pouco sobre a carta das francesas e o que vocês pensaram sobre ela.
Mariliz Pereira Jorge – Essa carta foi escrita alguns dias depois daquele discurso bárbaro que foi feito pela Oprah na noite do Globo de Ouro, em que foram todas de preto. Eu li a carta, que realmente acabou suscitando muitas reações. Acho que as pessoas a leram um pouco com o fígado e focaram muito mais nas partes que não concordavam do que nas partes comuns a todas as mulheres.
Elas começam essa carta falando da importância do Time’s Up, dizendo que, sim, assédio é um crime. Acho que a divulgação dessa carta teve um timing ruim porque pareceu uma resposta contrária ao Time’s Up, e não entendi dessa forma. Eu li e reli pelo menos umas quatro, cinco vezes, porque fui escrever sobre esse assunto. Elas cometem uma bobagem de ir lá e dizer que os homens vão começar a ser acusados injustamente, que não vão poder se defender, mas era uma coisa menor dentro dessa discussão toda.
Lendo a carta toda, realmente não acho que elas disseram, em nenhum momento, que o Time’s Up era uma bobagem, que assédio não existe. O começo da carta é falando sobre isso. Mas elas defendem a questão da paquera, da aproximação, que o assédio agora tem sempre essa conotação negativa, digamos assim.
Bruna Rangel – Que não é o assédio, né?
Mariliz Pereira Jorge – Que não é o assédio. Antigamente usava-se até esta palavra, o “flerte”.
Bruna Rangel – Acho que são coisas completamente diferentes, e você colocar até no mesmo texto fica ruim. Por quê? Você começa falando da importância e aí tem aquele “mas”. Acho que você chamar a atenção – “e os homens?” – para um grande movimento que está acontecendo é secundário. Porque os homens sempre tiveram esse espaço. E aí a gente não vai falar porque vai ferir o ego dos homens de Hollywood ou daqui? E isso é mais ou menos um instrumento para calar você. Quando você pensa “você vai destruir a reputação desse cara se você falar?”, entendeu? E é por essas razões que as mulheres se calavam. Quando uma denúncia é feita, várias mulheres tomam coragem também de contar as próprias histórias. Então, não é o momento de você falar “coitados dos homens”.
Nilcea Freire – A gente teve aqui a questão do Zé Mayer.
Mariliz Pereira Jorge – Que foi a única dentro daquele ambiente.
Nilcea Freire – Foi a única, e é importante que tenha sido. Agora, acho que existe uma questão que a gente tem que prestar atenção, que é o seguinte: ainda na polêmica das cartas, que é absolutamente rica essa polêmica. São sociedades muito diferentes. Há um puritanismo e hipocrisia norte-americano, eu trabalhei lá. E a sociedade francesa é um pouco mais aberta. Eu não estou aliviando a barra de quem condenou a carta das francesas, agora é importante entender que contextos culturais diferentes produzem reações diferentes.
Mariliz Pereira Jorge – Foram três ou quatro pessoas que assinaram. Uma das pessoas que assinou essa carta se chama Catherine Millet, que não é uma marchand, mas ela trabalha nessa área artística, de museus e exposições. Ela sempre foi muito respeitada. E ela lançou um livro tem mais ou menos dez anos que se chamava A Vida Sexual de Catherine Millet. Ela conta a vida sexual que tinha, que era uma promiscuidade sem fim porque participava de orgias e transava com 20, 30 homens na mesma noite. Então, você olha para essa mulher que sempre teve uma vida superlibertária e você chamar essa mulher de retrógrada, machista, é tão absurdo quando você conhece um pouco do perfil daquelas mulheres que assinaram aquela carta.
Priscila Caetano – Muito se debateu nas mídias sobre a diferença entre paquera e assédio. Ou seja, mais do que trazer o homem para o discurso, ainda há necessidade de mudar a mentalidade de algumas mulheres. Eu queria saber como vocês enxergam essa necessidade de agregar aquelas que ainda veem o feminismo sob a ótica da cultura do “mimimi”.
Bruna Rangel – Existe um critério objetivo para a gente diferenciar uma coisa da outra. Um abuso é um abuso, independentemente de você se sentir abusada ou não. Então, existe assédio não só na rua, em locais de trabalho, em casa, enfim… Pode ser que a pessoa não reconheça aquilo como assédio, mas nem por isso aquilo deixa de ser assédio. Muito da diferença nessa questão do assédio e do flerte acho que pode transparecer mais nas campanhas que ocorreram no carnaval do “Não ao Assédio”. E a gente escutava muito: “Mas e aí, eu não vou mais poder flertar?”. Se você não consegue conceber um flerte sem ser assédio, a gente tem muito trabalho pela frente. Porque parecia que era impossível você se divertir e ficar com alguém no carnaval sem assediar. Então, se a gente tem que explicar como flertar sem ser abusivo, a gente realmente está muito mal. Teve vários exemplos, no carnaval, de que assédio é tudo que vem depois do “não”, de várias campanhas que buscaram conscientizar.
Na questão da criminalização, ela sempre vem como uma solução fácil para um problema difícil. Ela é uma resposta do poder público para: “Estamos fazendo alguma coisa”. Na verdade, isso não é fazer nada. Porque vai continuar tendo uma lei, e o máximo que vai acontecer é prender as pessoas, que normalmente vão ser a camada mais pobre da população, que é sempre quem acaba sofrendo mais as consequências da criminalização e, no final das contas, não traz nenhuma mudança social. A criminalização só passa a ocorrer, ter algum efeito, depois que o assédio ocorre. Ela não tem efeito preventivo. Então, se a gente quer realmente mudar uma situação social, a solução não passa pela criminalização.
Mariliz Pereira Jorge – Nesse caso, eu acho que passa.
Nilcea Freire – Eu queria falar do carnaval de Olinda, de uma prática que existia no carnaval, que era a rua do beijo. Era um beco onde as mulheres passavam e eram beijadas à força. E eu estava lá em Olinda a serviço, fazendo uma campanha de não ao assédio e não à violência no carnaval. Fechamos aquele beco, e em todas as manchetes de jornal: “A Secretaria de Política das Mulheres quer proibir o beijo no carnaval”. E veio toda a carga de ridicularização, de que nós éramos umas moralistas.
Mariliz Pereira Jorge – Quando foi isso?
Nilcea Freire – Deve ter uns dez anos, mais ou menos. Várias manchetes: “É porque elas são umas feias, aquelas mulheres da Secretaria de Políticas para as Mulheres são umas barangas, ninguém ia querer beijar”. Trato do assédio no contexto da violência como um todo, e o limite entre o que é uma coisa, uma brincadeira, um elogio, é muito complicado. Acho que é importante discutir como há uma reatividade, como o machismo hoje é reativo ao empoderamento das mulheres.
Giulliana Bianconi – Não dá para desconsiderar que o enfrentamento gera uma reação. Muitas mulheres já escreveram a respeito, sobre como a força do movimento não passa despercebida e, também, traz uma onda conservadora como resposta. Mas não podemos esquecer que, independentemente da postura da mulher, tem um machismo enraizado, estrutural, e querendo ou não enfrentar, as mulheres passam por situações de opressão, que não é homogênea, atinge muito mais as mulheres pardas e pretas. Um “fiu-fiu” para quem mora na zona sul do Rio pode ser só um “fiu-fiu”, mas lá na favela ele tem uma invisibilidade tão grande. Por isso, não relativizo. Acho que tem violências que precisam ser combatidas com leis, sim. Eu entendo mulheres que não se incomodam com o “fiu-fiu”, mas acho um desserviço acharem ruim quem se incomoda, porque isso acontece, e acho que isso não colabora em nada.
Mariliz Pereira Jorge – Mas esse é o meu ponto. As mulheres não podem se incomodar com o meu “não incômodo”, mas não posso minimizar o sentimento da outra. Sobre a criminalização, foi aprovado na Câmara um pacote de projetos de lei, vai ter que ir para o Senado e depois para sanção presidencial, mas que tem justamente a ver com aquele problema que agora encontraram um nome, que é a “importunação sexual”, principalmente dentro do transporte público. Claro que a gente precisa de leis, concordo com você, a Maria da Penha está aí, acho que essa é importante porque aumentou-se a pena para estupro coletivo, o que é muito importante também. Mas nesse caso da penalização do “fiu-fiu”, que já acontece lá fora, realmente é uma coisa que eu não acho que tenha serventia prática.
Bruna Rangel – Eu estava falando da questão preventiva. A Lei Maria da Penha não cria nenhum tipo penal novo, a Lei do Feminicídio também não. Ela é um exemplo de homicídio qualificado, ela cria uma nova tipificação, traz um nome para um crime que já existe. Isso é importante também. Mas, para efeito preventivo, não é eficaz. Racismo é crime, feminicídio é crime, e mesmo assim existe racismo, feminicídio e violência doméstica.
Nilcea Freire – Só a existência da lei não vai nunca prevenir. Agora, é muito importante ter a lei. Por quê? Porque a lei é nada mais, nada menos que um instrumento de ação política.
Bruna Rangel – A lei geral, mas a lei criminalizadora tem essa diferença. Porque a lei cria política pública também, e isso é extremamente importante. Agora, a lei criminalizadora cria um crime.
Nilcea Freire – Não, a lei não cria o crime, a lei tipifica um crime que é importante ser tipificado. A gente se pergunta: “Adiantou?”. Quando eu era ministra, todo 8 de março eu tinha que responder à seguinte pergunta: quantos homens foram presos depois da Lei Maria da Penha? E eu dizia: “Isso não tem a menor importância”. Porque a lei tem um caráter de criar na sociedade um freio moral. Esse freio moral só vai ser aprofundado, só vai ter eficácia se nós pudermos trabalhar a cultura, porque não adianta ter só uma lei se, culturalmente, a gente não conseguir mudar corações e mentes. E nós estamos desde sempre vivendo no tripé que conforma esse estado de coisas, que é o patriarcado, que é o racismo e o patrimonialismo.
Mariana Simões – A Tassiana Chagas pergunta: “Gostaria de saber como as debatedoras veem a ascensão de um candidato presidenciável que ataca verbalmente as mulheres, e cujos eleitores veem apenas como ‘brincadeira’”.
Mariliz Pereira Jorge – Eu acho que é assustador. Não sei se vocês viram uma série, para quem não viu, recomendo: The Handmaid’s Tale, que mostra um pouco o que aconteceria no mundo se pessoas com essa mentalidade ganhassem.
Nilcea Freire – Acho que nós estamos em uma situação do ponto de vista político, eleitoral – a gente está começando o ano eleitoral –, que é bastante delicada. Porque, ao mesmo tempo em que essa criatura inominável cresce no eleitorado, ela cresce respaldada não por nada, ela está respaldada em uma parte da opinião pública que, efetivamente, apoia, pensa daquela forma.
Mariliz Pereira Jorge – Por isso a importância daquilo que a gente conversou. De tentar aumentar o entendimento do que é o feminismo, porque vejo que esses eleitores de que a gente está falando são pessoas que não sabem do que se trata. São pessoas que acham que o feminismo é um monte de mulher histérica que detesta homem e que não raspa o sovaco. A gente precisa quebrar esse pensamento tão atrofiado sobre esse assunto.