Buscar

Maurício Carvalho foi condenado por irregularidade em cartório e tem nome impedido de negociar com administração pública

Reportagem
26 de novembro de 2024
16:25

Indicado pelo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), para um cargo no alto escalão da Caixa Econômica Federal, o advogado Luiz Maurício Carvalho e Silva já cumpriu pena por improbidade administrativa após ter sido condenado pelo Tribunal de Justiça de Sergipe (TJSE). 

A condenação foi proferida em 2016 e diz respeito ao período em que o defensor era titular do Cartório do 2º Ofício da Comarca de Neópolis (SE). Somente em setembro deste ano, às vésperas de assumir uma vaga de consultor da presidência da Caixa, Carvalho pagou a multa aplicada como uma das penalidades, no valor de R$ 97,7 mil, e teve o nome retirado do Cadastro Nacional de Condenações Cíveis por Ato de Improbidade Administrativa (CNIA). 

O pagamento concluiu as sanções impostas no caso, conforme decisão publicada no Diário de Justiça de Sergipe, em 2 de setembro. No entanto, o nome de Maurício Carvalho, ainda consta no Cadastro Nacional de Empresas Inidôneas e Suspensas (Ceis), que tem a relação não só de empresas, mas também de pessoas físicas, impedidas de fazer negócios com a administração pública.

Por que isso importa?

  • Instituição financeira pública, a Caixa é um dos patrimônios mais importantes da União e hoje é comandada por aliados do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, alguns deles com relações diretas com nomes implicados em investigações de corrupção em andamento.

Advogado pessoal de Arthur Lira, Maurício Carvalho trabalha desde 20 de setembro na presidência do banco, que é comandado por outro aliado de Lira, Carlos Vieira. A nomeação de Carvalho na Caixa foi revelada hoje pela Folha de S.Paulo.

A Agência Pública apurou que Maurício Carvalho foi acusado pelo Ministério Público do Estado de Sergipe, em 2012, de irregularidades quanto à arrecadação das taxas para emissão de escrituras e procurações. Segundo a promotoria, ele recolhia o valor dos usuários do cartório, mas não emitia a respectiva guia pelo Sistema de Arrecadação do TJSE. A dívida chegou a R$ 35,7 mil. 

Ele alegou em sua defesa à época que “deixou de recolher os valores, de natureza tributária, por dificuldades financeiras e que tentou efetuar o pagamento do débito com o TJSE, porém encontrou resistência do Tribunal em receber o valor”, de acordo com informações do processo. 

Em dezembro de 2019, quando atuava como assessor jurídico da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), também por indicação de Lira, o advogado recorreu das penalidades aplicadas na condenação em primeira instância.

Em decisão publicada em setembro de 2022, o colegiado do TJSE acatou parcialmente o recurso. O Judiciário devolveu os direitos políticos que haviam sido suspensos pelo período de oito anos e reduziu a multa aplicada inicialmente de R$ 195,4 mil para R$ 97,7 mil. A proibição “de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que seja por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário” também foi reduzida de dez para quatro anos, sendo encerrada no ano da decisão. 

Procurado pela Pública, Carvalho enviou a certidão negativa do CNIA e destacou não ter “mais declarações para dar”. O deputado federal Arthur Lira não quis se manifestar sobre o assunto. Já a assessoria da Caixa Econômica informou por meio de nota “que a contratação de consultores de dirigentes obedece aos ritos de governança e integridade da instituição”. 

“O cargo tem como principais atribuições a avaliação de aspectos estratégicos, técnicos e legais relacionados aos processos, produtos e serviços do banco, e o acompanhamento do cenário político, econômico, social, tecnológico e cultural para auxiliar a alta gestão na tomada de decisões”, acrescentou.

Consultor da Caixa faz lobby com Executivo e Legislativo

Além de atuar como advogado nas áreas cível e administrativa, a empresa de Luiz Maurício Carvalho, Maurício Carvalho Advogados, presta serviços de relações governamentais e public affairs [campo entre relações governamentais e relações públicas]. O currículo do consultor divulgado no site da empresa informa que ele atua “perante o Congresso Nacional e Poder Executivo”. 

A página também destaca que Carvalho auxilia clientes “a influenciar políticas públicas e regulamentações” e que constrói pontes “entre setores público e privado, facilitando o diálogo construtivo com legisladores e autoridades”. “Seja moldando legislações ou defendendo interesses, estamos comprometidos em alcançar resultados impactantes nas esferas governamentais”, ressalta.

No seu perfil no LinkedIn, Maurício Carvalho aponta ainda que é diretor de assuntos legislativos da FCC Consultores Relações Governamentais e Institucionais desde janeiro de 2023.

A Lei 12.813/2013 estabelece, entre outros pontos, que configura conflito de interesses no exercício de cargo ou emprego no âmbito do Poder Executivo federal “atuar, ainda que informalmente, como procurador, consultor, assessor ou intermediário de interesses privados nos órgãos ou entidades da administração pública direta ou indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios”.

Caixa Asset: entre a amizade e o conflito de interesses

Conforme revelou a Pública no dia 4 de novembro, a empresa do advogado de Arthur Lira funciona no mesmo endereço onde está registrada a LF Consultoria, que pertence ao ex-assessor do deputado federal e pivô do escândalo dos kits de robótica, Luciano Ferreira Cavalcante. 

Maurício Carvalho disse à reportagem que apenas divide o imóvel com a LF Consultoria e que as empresas não têm relação. “Não tem nenhuma relação, é só um rateio de espaço físico”, afirmou Carvalho: “O Luciano é meu amigo de muitos anos já”. 

A Pública mostrou ainda que Luciano Cavalcante era sócio na LF Consultoria do então presidente interino da Caixa Asset – braço de gestão de fundos de investimento da Caixa Econômica Federal – Heitor Souza Cunha. Três dias após a publicação da reportagem, Cunha deixou a sociedade da empresa. No dia 13 de novembro, ele foi destituído do cargo na direção da Caixa Asset.

Estivemos no endereço da firma, localizada em uma mansão no Lago Sul, em Brasília. Ao ser questionada sobre o site com a relação dos serviços prestados pela LF Consultoria, a recepcionista do local indicou o site da empresa, mas o endereço exibia um nome diferente: FCC Relações Governamentais – a mesma divulgada por Maurício Carvalho em seu perfil no LinkedIn.  

Luciano Ferreira Cavalcante, ex-assessor do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL)
Ex-assessor de Lira, Luciano Cavalcante é pivô do escândalo dos kits de robótica

Reportagem da Folha de S.Paulo de hoje mostrou que o advogado Maurício Carvalho teve transações financeiras com outro alvo no caso do kit de robótica, o policial e empresário Murilo Sérgio Jucá Nogueira Júnior. 

Coincidências lucrativas 

A presidência da Caixa conta com 26 vagas de consultoria para diversas áreas. O salário não é divulgado no Portal da Transparência. Para se ter uma ideia, o vencimento dos consultores que compõem o quadro de concursados do banco é de R$ 47 mil, conforme apurou a Pública com servidores da Caixa.

Entre os consultores lotados na presidência da Caixa Econômica Federal também está o médico João Holanda Caldas, irmão do prefeito de Maceió e aliado de Arthur Lira, João Henrique Caldas (PL-AL). 

Ele foi nomeado para o cargo no banco em junho. 

Dois meses depois, o sobrinho do presidente da Caixa, Marcos Antonio Vieira Fernandes Filho, foi nomeado secretário municipal de Relações Federativas na prefeitura de Maceió. Servidor de carreira do banco, ele foi cedido à prefeitura da capital alagoana em 22 de agosto, conforme publicação do Diário Oficial da União. A portaria é assinada pelo tio, Carlos Vieira.

Edição:
Reprodução LinkedIn
Lula Marques/Agência Brasil
Alice Maciel/Agência Pública
Reprodução/LinkedIn
Reprodução

Não é todo mundo que chega até aqui não! Você faz parte do grupo mais fiel da Pública, que costuma vir com a gente até a última palavra do texto. Mas sabia que menos de 1% de nossos leitores apoiam nosso trabalho financeiramente? Estes são Aliados da Pública, que são muito bem recompensados pela ajuda que eles dão. São descontos em livros, streaming de graça, participação nas nossas newsletters e contato direto com a redação em troca de um apoio que custa menos de R$ 1 por dia.

Clica aqui pra saber mais!

Se você chegou até aqui é porque realmente valoriza nosso jornalismo. Conheça e apoie o Programa dos Aliados, onde se reúnem os leitores mais fiéis da Pública, fundamentais para a gente continuar existindo e fazendo o jornalismo valente que você conhece. Se preferir, envie um pix de qualquer valor para contato@apublica.org.

Quer entender melhor? A Pública te ajuda.

Faça parte

Saiba de tudo que investigamos

Fique por dentro

Receba conteúdos exclusivos da Pública de graça no seu email.

Artigos mais recentes