INSS, IOF, dólar, Senado e Câmara. O terceiro mandato de Lula enfrenta uma série de desafios: a conjuntura é de crise fiscal, são inúmeras as tensões com o Legislativo e o governo assiste ao fortalecimento de grupos de extrema direita nas redes sociais sem conseguir se contrapor a elas.
Para Rodrigo Prando, cientista político e professor do Centro de Ciências Sociais e Aplicadas da universidade Mackenzie, o governo atual ainda não conseguiu construir uma marca como nos mandatos anteriores e também não se adaptou a um novo papel do Congresso em relação ao Executivo, onde já não existe mais espaço para o presidencialismo de coalizão, que fez Lula governar no passado.
“Por que temos hoje uma relação tensa entre o Executivo e o Legislativo? O Bolsonaro entrega a chave do orçamento para uma figura central, que é Arthur Lira. O Legislativo – a Câmara dos Deputados e os senadores – ganham uma força muito grande manobrando fatias do orçamento sem necessariamente ter que passar pelo Executivo”, explica. “O Lula 3 não tem coalizão, o Lula 3 não tem base”, afirma.
Além da dança das cadeiras na política, Prando aponta que o governo Lula, assim como outros governos progressistas ao redor do mundo, têm dificuldade de fazer uma comunicação governamental que contraponha o que faz a extrema direita.
“Nós estamos falando de uma conexão, uma sinergia muito grande entre o discurso encantador da extrema direita e o impulsionamento que as big techs, que as redes sociais, dão a esse discurso. Os democratas têm que conseguir uma mensagem que seja capaz de entrar na mente, na razão, mas que consiga também entrar no coração das pessoas”, avalia.
Para o professor, há ainda outro desafio para os setores progressistas: mesmo que Bolsonaro permaneça inelegível ou seja preso, ele acredita que o bolsonarismo é maior que o ex-presidente, e sucessores devem ocupar esse vazio de poder. Já para a esquerda, ainda não há um nome que possa suceder Lula.
“A esquerda é Lula, depende do Lula. E, infelizmente, para a esquerda, para os progressistas, não existe um nome posto hoje, mas pode ser que surja, porque a política não está estagnada”, conclui.
Confira a entrevista completa.

Em uma entrevista para a jornalista Miriam Leitão, a ministra do Planejamento e Orçamento Simone Tabet alertou que, em 2027, seja quem for o próximo presidente da República, essa pessoa não irá governar com o arcabouço fiscal atual, com as mesmas regras fiscais, sem gerar inflação, dívida pública e ‘detonar a economia’. O que significa essa afirmação da ministra na prática?
A ministra está fazendo um chamamento, um apelo dentro do seu papel político, de dizer que, na situação em que nos encontramos, temos um problema fiscal.
A população paga imposto de uma maneira exorbitante no Brasil. E por que a gente paga imposto? Porque o custo do Estado e da democracia é tirado desses impostos. As câmaras de vereadores, os tribunais de justiça, as defensorias públicas, tudo isso tem custos. Inclusive, as eleições e as emendas parlamentares têm um custo.
Por sua vez, o governo nem sempre consegue entregar o que arrecada de acordo com o que a Constituição coloca como princípios básicos, aquilo que deveria entregar à sociedade.
Aí a gente tem um problema sério: porque o custo da máquina, do Estado, daquilo que é obrigatório para o governo – e daquilo que não é obrigatório -, sai da sociedade, do cidadão, quando compra um refrigerante, quando vai a uma academia ou quando compra um carro ou um produto de luxo. O imposto vai desde as pessoas mais simples até as mais ricas, com a questão de que os mais ricos têm escritórios de advocacia especializados para fazer um planejamento fiscal e tributário, podendo muitas vezes pagar menos até do que uma pessoa física.
Então, o que a ministra está fazendo é um chamamento à responsabilidade. E claro que ela vai se colocar dizendo o seguinte: nós estamos nos esforçando para tentar arrumar uma forma de equacionar este problema.
A pergunta é, que Estado nós queremos e quanto ele custa? E mais do que isso, o funcionalismo público – que tem que ser valorizado quando trabalha de forma correta -, quanto ele custa e como é a relação dele com a sociedade?
Já está se discutindo a questão do IOF. A situação do ministro Fernando Haddad é uma situação bastante difícil. O Haddad, de um lado, tem que arrecadar mais para manter a máquina funcionando, do outro lado, tem o Congresso, com Hugo Motta e tantos outros querendo uma solução que não seja o aumento do IOF.
E o que temos no horizonte? Ele e a equipe dele já falaram em shutdown, que é quando a máquina para de funcionar, quando você não tem sequer dinheiro para pagar a conta de luz da repartição pública. Então, a gente [precisa] equacionar isso de maneira muito séria, e aí você tem que trazer à tona os gastos do governo.
A ministra coloca um assunto que deve ser entendido de maneira muito séria por todos aqueles que acreditam que o Estado tem que ser eficiente naquilo que faz, arrecadar da maneira correta.

Em um país com tamanha desigualdade social como o nosso, quando falamos de ajuste fiscal, sabemos quem acaba pagando a conta: os mais pobres. Qual é a lógica quando a gente fala de ajuste fiscal?
Essa é a grande questão, quando se fala de ajuste fiscal, estamos falando de cortar investimentos onde? Do SUS? Da Educação? Das Forças Armadas? Do Poder Judiciário?
Na grande maioria das vezes, a gente tem, dentro do serviço público brasileiro, uma casta de super salários privilegiados, e esses nunca perdem, nunca há ajuste fiscal para as carreiras, por exemplo, no topo do Poder Judiciário. Não vemos ninguém discutindo isso com seriedade.
Infelizmente, quando se fala de ajuste fiscal, fala-se de corte e, geralmente, corte para as pessoas que têm menos condições, por exemplo, de pagar uma educação privada, uma segurança privada ou uma saúde complementar, uma aposentadoria complementar.
Então, é nesse sentido que o ajuste fiscal sempre soa muito positivo para o mercado, que é quando se mexe em direitos que são consolidados pela Constituição, não são entregues como deveriam, e acaba recaindo sobre a população em condições de vulnerabilidade ou mais fragilizada.
Tivemos também a fraude no INSS. Mais uma vez, estamos diante de um caso que não nasceu no governo Lula, mas que tampouco foi resolvido por ele, ao menos é o que parece. De que maneira isso também pode afetar a base eleitoral do governo?
A investigação surgiu dentro do governo Lula. Eu não estou isentando o governo de responsabilidades, tanto que eu tenho dito, muitas vezes, que o governo, ele não é proativo. O governo, ele tem sido reativo e quando reage, reage tardiamente, e reage mal.
O INSS me parece ser um local privilegiado para fraude. Por quê? Muito recurso, pouco controle, uma transparência que se mostrou absolutamente ineficaz e, especialmente nesse caso, lidando com pessoas que não têm condições de entender os aplicativos nos seus celulares, não têm condições de acompanhar um desconto que é muito pequeno individualmente, mas no volume é bilionário.
Essa fraude, ela vem de outros governos e, óbvio, ela deu um salto no governo Lula e isso fez com que o governo reagisse. O ministro caiu, não apenas o responsável direto pelos empréstimos. Dizem que foi trocado seis por meia dúzia, mas houve uma ação e a Polícia Federal está investigando.
Eu acho demorado e muito difícil, para não dizer muitas vezes impossível, recuperar todo esse dinheiro desviado. E aí, novamente, não recuperando quem que paga a conta? Nós, a sociedade.
Então, sem dúvida, é uma ação de corrupção num órgão estatal que merece atenção. Quando se tem repetidas vezes essa questão da corrupção no INSS, isso significa que, no mínimo, não existe um mecanismo eficaz de controle.
É claro que isso impacta negativamente o governo e fará com que ele tente, de todas as maneiras, trazer a narrativa para o lado dele. De que maneira? Dizendo ‘não começou conosco e nós estamos investigando’. Isso significa que ele vai tentar dar uma resposta à sociedade.
O impacto eleitoral a gente ainda não sabe, mas nós já sabemos que o governo tem uma desaprovação que está crescendo, e uma aprovação descendente, inclusive em segmentos do eleitorado como as mulheres e os moradores do Nordeste que, historicamente, são eleitores fiéis da base eleitoral do presidente Lula.
Os aposentados também podem impactar [a aprovação de Lula], a depender do tipo de narrativa não construída pelo governo, mas construída pela oposição e, neste caso, a oposição tem dado um banho em termos de narrativa e de construção de uma imagem de incompetência e de corrupção no atual governo.
A força das redes sociais no campo de embate político ideológico tem sido majoritariamente favorável à direita ou à chamada extrema direita no Brasil e não aos progressistas, partidos de esquerda e ao governo Lula, em particular. Então, pode sim haver um impacto ainda pior na base do governo a depender da ação da Polícia Federal e do desdobramento do escândalo,
Qual é a sua avaliação do governo Lula 3?
A esquerda é Lula, depende do Lula. E, infelizmente, para a esquerda, para os progressistas, não existe um nome posto hoje, mas pode ser que surja, porque a política não está estagnada.
Este governo Lula 3 não tem uma marca.
Existe uma marca do Lula 1 e do Lula 2, que é a diminuição da pobreza, da extrema pobreza, o incremento da classe média, do acesso à universidade para muita gente que estava fora desse processo e dos programas sociais, como o exemplo mundial, o Bolsa Família. Inclusive, no final de semana, saiu um estudo mostrando que o Bolsa Família impediu mais de 700 mil mortes através do SUS, provavelmente porque as pessoas se alimentaram, não entraram em desnutrição. Então, você vê que é um projeto reconhecido até mesmo pelos liberais.
Os dois mandatos [de Dilma Rousseff], um deles interrompido pelo impeachment, não trazem uma marca que você possa consolidar como positiva. A Dilma entrega um país em crise, sem condições de governabilidade, sofre o processo de impeachment.
De 2022 até agora, qual é a marca do governo Lula? O que ele trouxe de novidade nesse terceiro mandato? Ele, no máximo, requentou programas e projetos que haviam no Lula 1 e no Lula 2.
Lula não é mais o mesmo, o Brasil já não é o mesmo, a relação entre o Executivo e o Legislativo não são as mesmas e o cenário mundial também é outro. Então, o governo Lula 3 não tem, até o momento, uma ideia de força que sirva como plataforma para pedir votos em 2026.

Vemos uma tensão permanente entre Executivo e Congresso. Então, para além da proposta de isenção do imposto de renda, para quem tem renda de até R$ 5 mil, quais são as pautas do governo que estão em disputa? Existem pautas em disputa e existe, de fato, um bloqueio das iniciativas do governo no Congresso?
Por que temos hoje uma relação tensa entre o Executivo e o Legislativo? Do governo Bolsonaro em diante, mas especialmente ali, quando o Bolsonaro está acuado por conta da pandemia, surgem dezenas de pedidos de impeachment. O que o Bolsonaro faz? Não gostando do trânsito político, da discussão política, o Bolsonaro entrega a chave do orçamento para uma figura central, que é Arthur Lira. O Arthur Lira barra no peito e coloca na gaveta qualquer pedido de impeachment.
O Legislativo – a Câmara dos Deputados e os senadores -, ganham uma força muito grande manobrando fatias do orçamento sem necessariamente ter que passar pelo Executivo. Aquele presidencialismo de coalizão, em que um presidente ganha a eleição e forma um conjunto de partidos para ter uma base e governar, se modifica.
O Lula 3 não tem coalizão, o Lula 3 não tem base.
Qualquer pauta, qualquer ação do governo, quaisquer que sejam, na segurança, na questão do imposto, em qualquer uma que você pensar, ele tem que negociar pauta a pauta, tentando concatenar a agenda dele com a agenda dos presidentes que estão à frente do Congresso: de um lado, na Câmara, o Motta, do outro, no Senado, Alcolumbre.
Então, hoje, o Legislativo não tem mais aquela relação de que, quando o Lula chamava, por exemplo, alguém do PSB, ele dava o ministério. Você tinha um ministro do PSB, um ministro do MDB, um ministro do PSD. Provavelmente, há uns anos atrás, cada um desses ministros levavam os votos de todos os deputados para o governo. Hoje, não. Por quê? Porque os deputados têm liberdade para manobrar o orçamento sem necessariamente ter que ter aprovação do governo. Então, o governo perde a sua atratividade, a sua força simbólica, porque o governo no Brasil, o presidente no Brasil, sempre teve uma capacidade nuclear e todos os deputados orbitavam ao redor do governo esperando emenda, esperando dinheiro, poder simbólico e prestígio.
Hoje, o Lula não apresenta isso. Ele não está habituado a lidar com esta situação. E mais do que isso, a oposição ao governo Lula é uma oposição que ganhou força, que saiu do bolsonarismo, fortalecida em termos de narrativa, seja nos debates, na Câmara, no Senado ou nas redes sociais.
A extrema direita no Brasil – e não só aqui -, tem usado fake news, pós-verdade, negacionismo e teoria da conspiração. E nisso dá de lavada na comunicação política do governo ou em qualquer um do campo progressista.
Então, hoje o governo não tem uma agenda clara, que para mim vai muito mal. Ele não consegue se apresentar como alguém que tenha uma ideia e a defenda.
Agora, tem uma coisa que é inegável. O Lula concorre desde 1989. O Lula perdeu para o Collor no segundo turno, perdeu para o Fernando Henrique no primeiro turno, foi eleito duas vezes no segundo turno, fez a Dilma sucessora, reelegeu a sucessora, foi preso, saiu da prisão e voltou à presidência da sexta república. É alguém de peso, não é alguém que se possa desprezar no campo político.
Mas hoje, a situação do governo mostra essa tensão. Hoje, o Legislativo já não tem muito interesse e prestígio naquilo que fala o presidente Lula, naquilo que faz o presidente Lula. E o presidente e o governo muitas vezes está aquém e até mesmo refém de uma situação que é bastante distinta do Lula 1 e do Lula 2.

Há alguns dias, o Eduardo Bolsonaro declarou que pode se candidatar à presidência e o STF iniciou uma investigação sobre os movimentos de Eduardo nos Estados Unidos. Bolsonaro está sendo pressionado sobre que candidato ele vai apoiar. Faltando um pouco mais de um ano para as próximas eleições, como você avalia o bolsonarismo nesse momento?
Vamos separar o bolsonarismo do Bolsonaro, como a gente pode tranquilamente separar o Lula do lulismo. Eu sempre disse que o Lula é maior do que o lulismo. Só que eu acho que o Bolsonaro não é maior que o bolsonarismo. O bolsonarismo é maior.
Então, o bolsonarismo é maior que o Bolsonaro. E me parece que a situação do Bolsonaro é uma situação difícil. Por que é difícil? Porque ele está inelegível e se tudo correr de acordo com o que a gente tem visto no julgamento, em termos jurídicos, ele deve ter uma condenação e, obviamente, não poderá concorrer.
A pergunta que vai ficar é a seguinte: neste campo do bolsonarismo, que traz conservadores, liberais e até a extrema direita, quem é o nome a verbalizar? Dois nomes que despontam. Tarciso, governador de São Paulo, que tem um morde e assopra com o STF, e está com o pé em cada canoa: diz que confia nas urnas, no resultado eleitoral, mas diz que Bolsonaro não tentou golpe de Estado, entre outras coisas.
Do outro lado, dentro da família, tem o nome de Michele Bolsonaro aparecendo bem nas pesquisas quantitativas e qualitativas. E, nesse espaço, nesse interregno, aparece a figura de alguém que é da própria família: o Eduardo Bolsonaro.
Ele é aquele que, em termos de embate político, lembra muito o próprio pai. Eduardo Bolsonaro se licenciou, está nos Estados Unidos, agora sendo investigado por uma ação iniciada pelo procurador-geral da República, Paulo Gonet, porque ele está nos Estados Unidos buscando interferência de um país estrangeiro, de uma nação soberana, em outra. Então, ele pode ter também problemas jurídicos muito grandes.
Mas ele mantém algo fundamental pro bolsonarismo. O que é fundamental pro bolsonarismo? Manter a militância nas ruas e nas redes inflamadas. E isso o Bolsonaro e o filho conseguem fazer.
Então, eu diria para vocês que o bolsonarismo está em um momento delicado, mas que há algo fundamental na política, na ciência política: o poder não fica órfão. Bolsonaro não exercendo o poder, querendo ele ou não, isso vai se transferir para alguém, alguém toma e vai se credenciar. Como a política é muito dinâmica, a gente tem muitos nomes. A gente tem muitas figuras que podem se credenciar. A grande questão é que a gente tem, nesse momento, um dilema. O campo progressista tem um único nome, que é o Lula, e isso é ruim.
Como os setores democráticos podem reagir de uma maneira estratégica ao avanço da extrema-direita no país? Seja ela vestida de bolsonarismo ou mais ao centro, pensando que eles estão muito bem articulados, muito mais do que a esquerda, nas redes sociais e também nas ruas?
Nós estamos falando de uma conexão, uma sinergia muito grande entre o discurso encantador da extrema direita e o impulsionamento que as big techs, que as redes sociais, dão a esse discurso. Quando você pega um discurso que trata das questões de forma racional, sem gritaria, sem ofensas, um discurso mais moderado e que caminha para o centro político, esse discurso não ganha amplitude. Ao passo que todos os discursos políticos que trabalham com inimigos, que trabalham com sentimentos, raiva, ódio, medo, frustração, esses sentimentos são impulsionados pelos algoritmos. As redes sociais impulsionam porque isso monetiza e isso dá reverberação. E aí a gente tem um fenômeno bastante característico dos nossos tempos, a formação das bolhas.
Isso só aumentou a ponto da gente ter pesquisas hoje na ciência política falando que, quem se coloca do lado do bolsonarismo ou do lado do lulapetismo, não o fazem porque concordam necessariamente com aqueles valores, mas porque odeiam um outro lado. É o que tem se chamado de engajamento pelo ódio.
O que os democratas têm que fazer? Eles têm que fazer aquilo que é necessário numa democracia, a valorização da política. Tem que insistir na valorização do diálogo.
Aí você me pergunta, mas quem insiste nisso fica sem espaço? De fato, quando nós tivemos de um lado Lula e do outro lado Bolsonaro, a musculatura política eleitoral desses dois líderes com características populistas espremeu qualquer tentativa de centro. Não há um discurso que consiga ganhar sobrevivência nas redes ou no palco da política hoje que não seja espetacularizado, que não gere sentimentos.
Os democratas têm que conseguir uma mensagem que seja capaz de entrar na mente, na razão, mas que consiga também entrar no coração das pessoas. A gente tem que valorizar a política para entender que a política existe para que os conflitos na sociedade sejam resolvidos democraticamente. Em primeiro lugar, dentro das instituições. Em segundo lugar, à luz da legalidade. Em terceiro lugar, respeitando-se o diálogo. Quem não tiver esta aposta radical na democracia perde espaço.
A gente tem que descobrir uma forma de que o discurso dos democratas sejam discursos que encantem, como de certa maneira o discurso da extrema direita encanta. Se você pegar o discurso da extrema direita, ele é encantador. Se você pegar uma fake news e se você pegar várias fake news que se tornam muitas vezes teoria da conspiração, aquilo é de um jogo de palavras e de um encantamento muitas vezes irresistível.
Os democratas podem repensar a sua atuação, mas não é fácil numa sociedade na qual as redes sociais jogam esse papel. Não é à toa, por exemplo, que Donald Trump esteja disposto a oferecer sanções ao ministro Alexandre de Moraes porque Alexandre de Moraes enfrentou o Elon Musk. A rede dele, X, ficou fora do ar no Brasil porque ele não quis colocar um representante para responder pela empresa em solo brasileiro, coisa que a lei determina. Claro que se isso acontecer é uma invasão à soberania brasileira, mas Trump é um megalomaníaco, ególatra, como o Elon Musk também. São duas figuras nutridas nesse discurso reacionário populista da extrema direita digital.
Nenhum ministro é herói, nenhum ministro é imune a críticas, mas eles enfrentaram essas questões. Por quê? O nosso congresso não enfrentou. O PL 2630, chamado de PL da fake news, está encostado. Quando você fala de regulação das redes, não significa tolher a liberdade de falar das pessoas, a liberdade de opinião, não é isso. Não é castrar opinião, mas dizer que o direito que você tem a sua opinião, a sua liberdade de expressão, vem também recheada de responsabilidades e que discurso de ódio, ataque à democracia, isso não é liberdade de expressão. E essas grandes empresas lucram com isso.