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Em entrevista, o advogado Gustavo Lopes de Souza afirma que o governo sabia das demandas polêmicas da Fifa desde 2007

Entrevista
15 de maio de 2012
12:27
Este artigo tem mais de 12 ano

A Lei Geral da Copa, aprovada no Senado na última quarta-feira (9) e que espera sanção da presidente Dilma Rousseff, é considerada inconstitucional por alguns juristas e desagrada os movimentos sociais por conter pontos polêmicos como a permissão da criação das zonas de exclusão, a obrigatoriedade de férias escolares durante todo o período dos jogos, a criação de crimes especiais durante a Copa, a permissão da venda de bebidas alcoólicas nos estádios e a responsabilidade do Estado por “quaisquer danos e prejuízos” causados à Fifa (Veja quadro no pé da matéria).

Mas também há quem afirme que estas condições foram negociadas com o governo lá atrás, na candidatura do Brasil para a Copa – e só quem  não ficou sabendo foi a população. Em entrevista ao Copa Pública, o advogado especialista em direito desportivo Gustavo Lopes de Souza, autor do livro “Estatuto do Torcedor: A Evolução dos Direitos do Consumidor do Esporte”, explica que as mesmas regras foram colocadas para a Alemanha e para a África do Sul, mas que cada país negociou e geriu de formas diferentes, dando rumos opostos à Copa: “A Alemanha lucrou 140 milhões de euros com a Copa do Mundo. Sabe quando a África do Sul lucrou? Nada”.

O que o senhor acha da versão da  Lei Geral da Copa que foi aprovada no Senado?

O que eu costumo dizer é que em 2007, quando o Brasil conquistou o direito de organizar a Copa do Mundo, aceitou os preceitos estabelecidos pela Fifa. Preceitos de ordem absolutamente comercial. O poder executivo brasileiro já sabia de todas as exigências da Fifa em 2007. A Lei Geral da Copa está sendo debatida agora, mas nada ali é novidade para niguém. Na revista Carta Capital, se não me engano, tinha uma matéria com o título: A Copa é de quem? Uma foto do Blatter e uma foto da Dilma. Não há dúvidas de que a Copa é da Fifa!

Como isso aconteceu nos outros países? Na Alemanha e na África do Sul, por exemplo?

Alguns dos debates que nós travamos aqui também foram travados na Alemanha. Um deles foi sobre a liberação de vistos. Porque facilitaria a entrada de qualquer um em território alemão, teria o perigo de terroristas etc. A Alemanha simplificou o procedimento consular para conceder o visto, mas não abriu mão de seus ritos. Já a África do Sul abriu mão de tudo.

Este foi o ponto mais crítico para a Alemanha?

Um dos mais críticos. Outro grande problema que aconteceu lá foi por causa da bebida alcoólica, mas sob outro aspecto. Talvez lá tenha sido o lugar com mais problemas com as condições comerciais da Fifa. Porque aqui no Brasil a briga é a respeito de entrar com bebida alcoólica no estádio. Vários setores da sociedade são contra e a Fifa quer a entrada de bebida por causa da patrocinadora Budweiser. Na Alemanha a discussão foi outra. O país é conhecido por suas cervejas, principalmente as artesanais. E a Budweiser teria exclusividade dentro dos eventos. A Alemanha queria que além da Budweiser fossem vendidas suas cervejas artesanais. A Fifa acabou cedendo mas apenas nas cidades em que havia fábricas de cervejas artesanais; eles alegaram que a cerveja estava ligada à cultura local. A Fifa exige de todos os países. A diferença está na condução disso.

Enquanto a Alemanha botou limites a África do Sul cedeu em tudo…

Exatamente. A Alemanha lucrou 140 milhões de euros com a Copa do Mundo. Sabe quando a África do Sul lucrou? Nada. Por quê? Pela maneira de se conduzir a coisa. A Alemanha pensou no legado. No ano seguinte à Copa, foi o segundo país mais visitado do mundo e um estudo apontou que o grau de simpatia de turistas com o povo alemão foi o maior da história desde a segunda guerra mundial. E a África do Sul?

Mas você tem críticas à nossa Lei Geral da Copa?

Eu não concordo por exemplo que a Fifa seja dispensada de pagar as taxas do imposto INPI, que todo mundo paga. Se eu tenho uma marca, tenho que pagar. A Fifa não. Proibir o marketing. É realmente complicado se, por exemplo, eu torço para um time de futebol que tem marcas na camiseta e eles me proíbem de entrar no estádio. Porque a pessoa tem que ter a intenção de fazer marketing. Tem outra questão que eu considero um retrocesso. O nosso Estatuto do Torcedor diz que os organizadores de eventos esportivos responderão, independentemente de culpa, por quaisquer danos causados aos torcedores. Se ontem no jogo do Atlético Mineiro com o América eu caísse da arquibancada ou alguém me agredisse dentro do estádio o clube mandante e a federação mineira organizadora teriam que me indenizar, independentemente da culpa deles. Segundo a nossa Lei Geral da Copa, a Fifa não responderá da mesma maneira. A pessoa que sofrer um dano durante um jogo da Copa do Mundo vai ter que provar que a Fifa teve culpa, o que não vai acontecer. Mas realmente o que me preocupa mais até do que a legislação é a gestão disso tudo. Não só durante os jogos mas depois, com estádios que vão virar elefantes brancos, por exemplo. A África do Sul está sofrendo até hoje com a subutilização das obras e com a falta de legado que a Copa deixou por lá.

Veja o quadro produzido pelo Comitê Popular da Copa de 2014:

 

O blog Copa Pública é uma experiência de jornalismo cidadão que mostra como a população brasileira tem sido afetada pelos preparativos para a Copa de 2014 – e como está se organizando para não ficar de fora.

 

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