Buscar
Agência de jornalismo investigativo
Checagem

Corrente falsa associa uso do plástico a 52 tipos de câncer

Texto compartilhado nas redes sociais afirma que, ao entrar em contato com o calor, material produz substâncias que causam a doença; especialistas contestam afirmação

Checagem
10 de outubro de 2017
18:00
Este artigo tem mais de 6 ano
Mensagem afirma que embalagens plásticas podem liberar compostos tóxicos
Mensagem afirma que embalagens plásticas podem liberar compostos que causam câncer (Foto: Katy Warner/Flickr)

“A Associação Americana de Médicos deu as respostas para as causas de câncer:

1. Não tome chá em copos plásticos
2. Não coma nada quente em sacola plásticas. Ex: batatinha frita
3.
Não esquente comida em micro-ondas usando um material plástico.

Lembre-se: Quando o plástico entra em contato com o calor, ele produz produtos químicos que podem causar 52 tipos de câncer. Assim sendo, essa mensagem é melhor que 100 mensagens sem utilidade. Informe as pessoas que você ama para assim ficar livre de tais efeitos.”

Falso

Um alerta que atribui o surgimento do câncer ao uso do plástico tem circulado nas redes sociais. A mensagem afirma que a Associação Americana de Médicos encontrou a resposta para as causas da doença: o plástico produziria elementos químicos ao entrar em contato com o calor ou com alguma superfície quente e, com isso, provocaria 52 tipos diferentes de câncer. O Truco – projeto de checagem da Agência Pública – analisou as informações divulgadas pela corrente e concluiu que são falsas.

Como a mensagem refere-se a uma associação norte-americana, a reportagem procurou artigos da entidade sobre o assunto. Não foi encontrado nenhum texto que coloque o plástico como causador do câncer ou que afirme que, ao entrar em contato com o calor, gere algum resíduo prejudicial à saúde. “Não existe nenhum estudo que conclua ou nenhum nível de evidência que associe o uso do plástico à doença”, diz Hakaru Tadokoro, chefe de oncologia clínica da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

Especulações como essas são recorrentes, principalmente as que relacionam o Bisfenol A (BPA) – polímero usado na produção de alguns tipos de plástico – ao surgimento de doenças. “Não existe nenhum estudo científico que associe o uso ou aquecimento do plástico ao câncer. Mesmo que houvesse a liberação de alguma substância, seria mínima e não causaria nenhum dano à saúde. O plástico é extremamente seguro. Para o organismo ele é totalmente inerte e não existe nenhum estudo que comprove seus malefícios”, afirma André Murad, professor de oncologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Para a diretora de oncologia clínica do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp), Maria Del Pilar Estevez Diz, é precipitado afirmar que o uso de utensílios plásticos em contato com o calor possa ajudar a desenvolver a doença. Segundo ela, é preciso ter cautela nas interpretações. “O ser humano é complexo. Depende do tipo [de plástico], tempo de exposição e variação de temperatura. Não se pode generalizar. O consumidor precisa ficar atento à restrição do produto. Existem os que podem ou não ser expostos ao micro-ondas.”

É necessário, contudo, observar as recomendações dos fabricantes para o manuseio de vasilhames plásticos em superfícies quentes. Existem alguns tipos que não são apropriados para micro-ondas e, quando colocados em altas temperaturas, podem liberar substâncias. Mas todos os especialistas ouvidos pela reportagem afirmam que a quantidade liberada é muito pequena, e por isso, não se pode afirmar que causam uma mudança no organismo capaz de desencadear o câncer.

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) é responsável pela regularização, controle e fiscalização dos produtos e serviços que envolvam risco à saúde pública, incluindo as embalagens para alimentos. A agência regulamentou o uso do BPA na produção de materiais plásticos em contato com alimentos pela Resolução RDC nº 56, de 2012, que proíbe o uso da substância em mamadeiras e artigos similares destinados à alimentação de lactentes.

Imagem da corrente que circula pelas redes sociais.
Imagem da corrente que circula pelas redes sociais. Foto: Reprodução

Em nota, o órgão esclareceu as razões da medida. “Essa restrição foi motivada pelas incertezas científicas sobre a segurança do BPA e na maior vulnerabilidade deste público (baixo peso corpóreo, menor desenvolvimento do organismo e elevada frequência de uso da mamadeira). Além dessa restrição, a Resolução RDC nº 56, de 2012, define o limite de migração específica para o BPA de 0,6 miligramas por quilo de alimento ou simulante. Vale reforçar que a presença de BPA no material de embalagem não significa necessariamente que esta substância migre para o alimento, pois a migração é influenciada pelas características do alimento (alimentos ácidos, alimentos gordurosos), da substância e da temperatura e tempo de contato (enchimento a quente, refrigeração, temperatura ambiente, acondicionamento por longos períodos ou para contato breve)”, afirma.

A Anvisa declarou também que tem acompanhado os trabalhos internacionais e, até o momento, não há evidências científicas que justifiquem uma ampla proibição do BPA em materiais destinados ao contato com alimentos, considerando os limites de migração estabelecidos na legislação. Ou seja, a decisão foi motivada por cautela, uma vez que não há provas de que exista, de fato, uma relação entre o uso do material e o surgimento do câncer.

Precisamos te contar uma coisa: Investigar uma reportagem como essa dá muito trabalho e custa caro. Temos que contratar repórteres, editores, fotógrafos, ilustradores, profissionais de redes sociais, advogados… e muitas vezes nossa equipe passa meses mergulhada em uma mesma história para documentar crimes ou abusos de poder e te informar sobre eles. 

Agora, pense bem: quanto vale saber as coisas que a Pública revela? Alguma reportagem nossa já te revoltou? É fundamental que a gente continue denunciando o que está errado em nosso país? 

Assim como você, milhares de leitores da Pública acreditam no valor do nosso trabalho e, por isso, doam mensalmente para fortalecer nossas investigações.

Apoie a Pública hoje e dê a sua contribuição para o jornalismo valente e independente que fazemos todos os dias!

apoie agora!

Quer entender melhor? A Pública te ajuda.

Truco

Este texto foi produzido pelo Truco, o projeto de fact-checking da Agência Pública. Entenda a nossa metodologia de checagem e conheça os selos de classificação adotados em https://apublica.org/truco. Sugestões, críticas e observações sobre esta checagem podem ser enviadas para o e-mail truco@apublica.org e por WhatsApp ou Telegram: (11) 99816-3949. Acompanhe também no Twitter e no Facebook. Desde o dia 30 de julho de 2018, os selos “Distorcido” e “Contraditório” deixaram de ser usados no Truco. Além disso, adotamos um novo selo, “Subestimado”. Saiba mais sobre a mudança.

Leia também

Corrente no WhatsApp mente sobre mudança no Imposto de Renda

Por

De acordo com mensagem que viralizou no aplicativo, governo prepara decreto que "atinge diretamente a classe média"

Correntes no WhatsApp afirmam que podem chegar a milhões em pouco tempo

Uma corrente de WhatsApp pode atingir todos os brasileiros?

Por

Checamos como funcionaria o compartilhamento de mensagens pelo aplicativo se todo mundo repassasse o texto para pelo menos seis contatos

Notas mais recentes

O que diz o relatório final da CPI que tentou criminalizar as ONGs e não conseguiu


Servidores do Ibama e ICMBio cobram governo Lula e ameaçam parar fiscalização


Senado vai decidir se regras em pesquisas clínicas com seres humanos devem mudar 


Com desmatamento no Cerrado em alta, governo revela como quer frear a destruição


Câmara avalia pedidos de punições mais rigorosas em casos de trabalho escravo


Leia também

Corrente no WhatsApp mente sobre mudança no Imposto de Renda


Uma corrente de WhatsApp pode atingir todos os brasileiros?


Faça parte

Saiba de tudo que investigamos

Fique por dentro

Receba conteúdos exclusivos da Pública de graça no seu email.

Artigos mais recentes